terça-feira, 1 de julho de 2008

«um filme é uma parte irrepetível da vida. Não posso desperdiçar a vida com rascunhos.»

Para mim esta história não é sobre o presente mas sobre o que é eterno. Não é sobre a Rússia dos dias de hoje, a sua política no Cáucaso, ou o seu exército, mas sobre a vida eterna da Rússia. A guerra é sempre uma coisa terrível. Neste filme sobre a guerra não há guerra. As operações militares foram levadas para fora dos limites do filme. Não gosto de filmes sobre a guerra. Foi suficiente para mim estar lá uma vez e ver com os meus próprios olhos para fazer com que esses ataques espectaculares, pitorescas explosões, corpos a cair em slow-motion , se tornassem ligados ao conceito de “vulgar” e “falso”. Não há poesia na guerra, não há beleza, e nunca deveria ser filmada de uma forma poética. É um horror que não se consegue exprimir, a degradação humana não pode ser expressa. E para compreender isso basta viver uma só vez esta experiência real. Alexandra era o título provisório mas tanto os produtores Russos como Franceses pediram para o manter. Há uma raiz universal ligada ao nome Alexandra. O nome desenha um simples e directo caminho à personagem.

Quanto mais artística é a tarefa, mais honestidade é necessária. Nos últimos anos toda a gente fez filmes sobre a Chechénia na Kabardino-Balkaria. Mas nós fizemos o filme na Chechénia: o ar é diferente lá. A rodagem teve lugar na verdadeira densidade das coisas – em Grozny, perto de Grozny e em Khankala, onde estão as tropas russas. A rodagem durou 28 dias e foi sob condições extremas. Eu tinha de ir para lá: só ali há ar real, pessoas reais, tensões reais. Além disso, um filme é uma parte irrepetível da vida. Não posso desperdiçar a vida com rascunhos. De forma a poder falar com honra e dignidade sobre o que estamos a falar, tivemos de passar pela experiência do risco. Viajámos em veículos blindados até aos locais de rodagem, tínhamos uma escolta. Afinal de contas, havia explosões constantes, ataques, campos minados. Galina Vishnevskaya viveu num bunker e movimentávamo-la separadamente. Mudávamos as matrículas, os carros, os percursos, tudo era codificado. Por vezes saímos fora do carro, filmávamos alguns minutos e voltávamos para dentro. Filmámos mesmo no sítio onde as pessoas cumprem serviço militar, onde vivem, dormem, comem. A atmosfera ajudou-nos aequilibrar as coisas, a ver mais clara e honestamente.

Alexandr Sokurov

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