Exactamente Sr. Bénard, a mais elaborada mise-en-scène da obra de Lubitsch. Pode-se realmente já ter visto muitas, como esta nunca se viu.
Só alguém em estado de graça, com a matéria ideal na palma da mão e no máximo do seu talento conseguiria tamanha empreitada.
È verdade que Tesson também tem razão, na aproximação deste filme ao coração de Capra, mas se é Lubitsch heart (e é muito) é porque primeiramente houve Lubitsch toutch.
E no fundo é isto: todos os versos e reversos das personagens (e entre elas), bem como dos seus sentimentos. Os que se vêem e os que não se vêem (pessoas e relações), a fábula moral (quem vê caras ou corpos não vê corações), os oportunistas e as oportunidades e a eterna luta pelo lugar mais cimeiro da hierarquia. A história de amor, evidentemente.
Onde tudo se passa? Numa pequena loja, praticamente só nela, e quando de lá saímos vamos para espaços idênticos – o restaurante, o quarto, mesmo a rua. Sempre espaços bastante teatrais, espécies de palcos na verdadeira acepção da palavra, que são tratados e varridos, genialmente, pela câmara de Lubitsch. Mise-en-scène – pôr todo este mundo, todo este microcosmos, em cena.
Muitas portas se abrem, muitas se fecham e muitas vezes elas são atravessadas. Se Lubitsch também foi conhecido por «cineasta das portas», este filme é a justificação. São elas que tudo ligam e tudo separam, que tapam e destapam, que abrem e fecham os caminhos. São elas que permitem esconderijos e revelações.
Se Lubitsch eleva algo tão aparentemente banal como as portas a elemento primordial e metafórico da realização e de uma obra, é só mais uma prova do seu incomensurável génio.
The Shop Around the Corner
É um dos meus filmes preferidos, e tem um dos planos que mais me marcou no cinema: a mão que, nos correios, busca a carta e nada encontra.
ResponderEliminarE é impossível não rir com aquele plano final.
Um abraço ;)