segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Acho que nem deveria estar a escrever sobre “The Wrestler”, gostei tanto, mas tanto, que quaisquer palavras me soarão desnecessárias. Fuck. A coisa é tocante. Melhor, desarmante. Aquilo que todos já ouvimos falar está lá em bruto, e é impossível descrever – um homem e uma espécie de via-sacra, os fantasmas que retornam, a dificuldade de reconhecimento em relação ao que se foi, o afunilamento. Acho que tem a ver sobretudo com a primordialidade de um corpo. “Este sou eu, é assim, mais nada”. Isso e a vocação. Mas não vale a pena divagar, acho que o trunfo principal do filme é a singeleza, melhor, a forma como se recusa a deixar brotar grandes temas, mensagens, lições, falsas esperanças, etc…Não existe demagogias ou empolamentos, tudo é de uma simplicidade quase naïf (no melhor sentido).
Acho que no limite o filme é todo como no plano inicial – uma câmara a seguir um homem, o seu corpo, o peso deste e das coisas. E é assim que o filme se torna grande e vem mostrar coisas realmente vitais.

E Mickey Rourke é extraordinário, com todas as letras, o que ele oferece é a mais sublime dádiva que um actor pode dar ao seu realizador. Dá-se a ele próprio. E de resto é preciso dizer isto – Darren Aronofsky está totalmente à altura daquele homem e dos acontecimentos. É tanto mais surpreendente quanto é verdade. Zero de exibicionismos, zero de conceptualismos de pacotilha, nenhum “inventanço” de montagem, nem uma merda de um truque, tudo é filmado à altura dos homens e das ocorrências. Uma câmara que só se interessa pelo homem e pelo mundo que o rodeia, que cria o espaço necessário para captar perfeitamente os dois, para os fazer sentir. A câmara, o olhar, só têm interesse por aquela carne, por aquelas emoções sussurradas. Nunca ultrapassa a linha em que a técnica se faz matéria e centro. Ali a matéria é o homem e o mundo. O contrario dos filmes anteriores de Darren. Portanto, dizer que os actores estão fabulosos (e estão, todos), mas que Darren não cumpre, é uma daquelas boutades dignas do mais sofrível pedantismo. Porque a única coisa que aqui se manipula é a luz - tornada agreste, crua - o recurso mais antigo e essencial do cinema, que é o que tudo molda e deixa entrever. De resto, Marisa Tomei a estilhaçar qualquer ideia feita – presença de “tomates” (salvo seja) – rude, visceral, mas muito mulher. E também a Evan Rachel Wood, sempre que entra a coisa atinge umas alturas (foda-se, está linda)…

P.S: porra, os “coçórios” das cenas de luta reinventam a palavra visceral. E mesmo aqui só temos a câmara e a exposição da película a trabalhar. O resto é carne, sangue, suor. O Darren têm tudo nas mãos para se tornar outra coisa...

P.S 2: tanta coisa, blablabla, e eu quero é rever o filme…para apurar similitudes com o “Rocky Balboa”, estar com os três actores e para escrever umas coisas sobre os 90´s (ou então, não…).

7 comentários:

  1. Acho que uma vez em conversa contigo disse que ainda te veria a elogiar o Aronofsky. A questão é que os truques estão no novo do Boyle, nunca estiveram no Aronofsky. The Wrestler dói, corrói, é seco e amargo e straight to the point. Estão ali todas as cicatrizes e todos os murros, tudo a emanar o melhor do cinema americano. Podes não gostar de um Requiem, de um The Fountain, mas a verdade é que sempre houve essa obsessão pelo essencial, por filtrar tudo até conseguir uma espécie de origem. Para mim, Darren não mudou, apenas se tornou mais apurado para conseguir dizer tudo isto num registo realista e nunca, nunca, distanciado.

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  2. Mas no "Requiem", por exemplo, a profusão de filtros e de velocidades não parece advir completamente de outro realizador que não o Darren deste "The Wrestler"? aqui sim, seco, completamente....

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  3. ou seja: o que no "Requiem" ele tentava com as acelerações na imagem, os ecrãs divididos, a facilidade dos filtros, etc...aqui ele consegue absolutamente mais com a frontalidade da câmara e com os actores, despidos de tudo...

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  4. A questão é que as velocidades no "Requiem" não os ritmos ilusórios de "Slumdog". São uma opção, não um disfarce ou um facilistismo. Nem os filtros lhe retiram magia genuína da imagem, nem a steady cam o faz parecer um videoclip. Há ali todo o sufoco, toda a alucinação. Não é um Rourke despido perante a frontalidade da câmara, mas não deixa de ser um cinema absolutamente directo, sem cinismos ou artifícios que o prejudiquem. Os "truques", em "Requiem", são necessidades, não máscaras para agradar a x ou a y.

    Ou seja, como pode Aronofsky ter criado The Wrestler como recomeço? Não é o caso, já lá estava tudo. Pessoalmente, identifico-me mais com este olhar realista, que segue Rourke atrás dele, consciente de que a afirmação daquele corpo está para vir. Gosto desta noção de viagem, do homem incompleto, das oscilações. E os três actores são fabulosos. Mas os temas e as dores, o que emana inexplicavelmente daquelas imagens independentemente da sua forma, sempre foi uma imensa solidão.

    O motor de Aronofsky sempre foi o mesmo.

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  5. ok Carlos, não consigo ver a coisa assim. Para mim existirá sempre um abismo e um antes e depois entre este "The Wrestler" e o que ficou para trás...

    Esperemos pelo "Robocop"...

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  6. Não me costumo meter aqui ao barulho, mas apesar de também achar que este The Wrestler supera tudo o que o realizador nos ofereceu antes, também eu sou um enorme fã do seu trabalho anterior, e tendo a concordar com a visão do Carlos. Talvez isto não te faça mudar mínimamente de ideias, mas recomendo vivamente ouvir os comentários áudio dos filmes anteriores do realizador, para se perceber que, independentemente dos gostos estéticos, Aronofsky é sempre muito claro a explicar cada efeito, cada "malabarismo", que nunca me parece falso. E concordo que no seu cinema, a merda é sempre exposta como verdadeira merda, nunca próxima do que Boyle fez com a celebração do excremento - e eu até gosto de alguns dos seus filmes, mas deste cada vez gosto menos.

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  7. robocop by aranofsky? forget about it. Mas estamos todos de acordo The Wrestler é brutal!

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