Dennis Hopper. Bruno Ganz. Nicholas Ray. Samuel Fuller. Jean Eustache. 1977. O périplo inicia-se com uma visita de Tom Ripley/Hopper a um tal Derwatt/Ray, isto em Nova Iorque, Estados Unidos da América. Rapidamente a câmara de Wenders se colocará em Hamburgo, Alemanha. Negociatas artísticas, desconfianças e junta-se ao bando Jonathan Zimmermann/Ganz. Personagem esta que está a dar as últimas e que por isso mesmo é convocado para ir até Paris, França, onde além de uma opinião médica terá que apagar um desconhecido. Instala-se junto ao Sena, que é também junto à estátua da liberdade local. Cumpre a missão. A esta confusão toda vai-se juntar um mobster americano/Fuller. O resto é naturalmente para ver, embora me pareça que este resto, que é um resto derivado de um romance de Patricia Highsmith, não interesse por ai além a Wenders. O que lhe interessa (ou o que me interessa)? A mítica, sem sombra de dúvidas, ou, como diria Mário Jorge Torres, a “americanística”. Que simplesmente é isto de juntar dois dos maiores cineasta americanos que alguma vez existiram, dois dos mais rebeldes também. Que é utilizar tantos espaços e lugares diferentes para parecer só um, o país do cinema, dos estúdios, dos géneros, etc. Veja-se o tratamento especial da cor. Veja-se o modo como o alemão desmultiplica símbolos, referências, numa arte de contra-bando: aqueles neons, que nada tem que ver com os que irão depois aparecer nos anos 80, mas que em tudo derivam da Hollywood clássica. Os bilhares. Os céus azuis, verdes e vermelhos. Os cowboys e toda a iconografia de Hopper e de Ray. As armas. Marlboro. Coca-Cola. Uma casa branca. Etc.Etc.
Isto tudo mas também um interesse pelas texturas e pela peculiaridade de cada lugar, pela singularidade, mesmo que enquadradas, sempre, pelo Cinema. E um interesse genuíno pelas personagens, aqui não há bonecada para ninguém. Mas o que acho essencial, e que me há-de tocar sempre nestes filmes iniciais de Wenders, é esta inocência das situações presentes a cada cena (que pode ser um encontro entre Ganz e Eustache num bar parisiense), esta inocência das coisas, das imagens, esta abstração temporal, esta fascinação absolutamente assumida pelos lugares, pela maneira americana e pelos mitos. Daí uma poética realmente sentida e uma ausência de qualquer pompa ou pretensão. Nada de saudosismo, antes uma melancolia preciosa e tocante. O cinema e só o cinema e a vontade de viajar e de deixar entrar mundos. “Der Amerikanische Freund” têm a força e a candura das coisas inatacáveis e cristalinas, é um produto do amor e isso basta-lhe.
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Estava a pensar ainda na estranheza do filme, na sua globalidade. E se quase tudo remete para o deslumbramento de Wenders pela América, existe algo que é muito, digamos, não americano. Isto porque tanto se pode dizer que influenciado pelos mestres europeus como pelos grandes cineastas asiáticos (Japoneses sobretudo) que o alemão sempre venerou. Sinto isso no tratamento temporal dado aos planos de ligação, aos exteriores, bem como naqueles casos mágicos em que a decoupage mais clássica – planos/contra planos, etc. – parece dar lugar a uma maior contemplação e fixidez. Obviamente que nesses momentos o tempo entra e o filme torna-se outra coisa, mais palpável, mais atmosférico, ainda mais misterioso e perto das fantasias. E é uma calma, uma doçura, uma serenidade…
Nesses instantes, todos os signos e toda a fascinação fica suspensa ou fica dentro de um outro tempo. Wenders a dominar as durações e os ritmos, nesta altura de maneira única. É por aqui que filmes como este, ou como depois “Paris Texas”, não se parecem com muita coisa, apesar de pegarem e convocarem tantas outras.
Considero que o Wenders da fase americana não chega aos calcanhares do da fase alemã, mas mesmo assim fiquei curioso.
ResponderEliminartambém eu. mas atenção, este Wenders é da fase alemã.
ResponderEliminarAi é?!! Pensei que fosse da fase americana. Assim ainda fiquei mais curioso.
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