domingo, 18 de agosto de 2013

 
 
Johnny Hawks, o “The Indian Fighter” que André De Toth soltaria por um Oeste Americano mais contraditório do que nunca, é, esquecendo o pleonasmo, tão solitário como o filme. Findada a guerra civil, vai-se convocar nele uma outra mais lata e intemporal, que acarretando todo o sangue e miséria da anterior, mete o genuíno amor e o coração desarmado ao barulho, e isso não se aceita. Sobe a cortina e Hawks está, como ele diz ironicamente, do lado dos civilizados, não se privando de espiar uma índia a banhos, aproximar-se, beijá-la à força que ele sabe que só o é por causa dos preconceitos que os prendem. Presos os dois e por conseguinte todo o território e mais além, numa farsa calada perfeitamente suja e amoral. Até hoje, é o desengano para o plano capitular que renova a boda.
 
Hawks representa incredulidade e pasmo nas suas deambulações opostas, nos seus interesses, na pertença. Abre fogo para os dois lados, beija raparigas brancas e mulatas, fia-se em ambos os chefes e em ambos os credos, parece querer tudo. Não para de correr e ofegar por este caso que parece sempre perdido. Mais achas para a fogueira: quando contraria aquele fotógrafo que pretende a documentação e a abertura da ebulescente região aos forasteiros, dizendo-lhe que adora esse deserto como o corpo de uma mulher sua e por isso não o quer partilhar, para ainda assim o encorajar a fazer o seu trabalho. Ou, no cume bélico, o soldado que perde a compostura e cuspe o que todos sentem mas ninguém conclui: que ao invés do Fighter ele é mais um The Indian Lover. E sim, Johnny Hawks, no seu estilhaçamento, parece sempre ter como origem, referência, destino e túmulo os não civilizados. Com a pinta de um descomungado e o temperamento maldito.
 
Pode-se e deve-se aproximar esta obra aos avisos e à paixão sem freios de “Broken Arrow “ de Delmer Daves, ao balanceamento do Rod Steiger de “Run of the Arrow” ou a plenitudes efabulatórias do Monte Hellman que sonhou “Amore, piombo e furore” - a cena da união das vontades, corpos e lábios de Martinelli e Douglas, essa apoteose luminosa e ruminante, renovado ou primeiro baptismo, é toda a génese de uma poética raríssima; Porque da extrema sentença de Hawks ao chefe Sioux, advertindo-o para longas guerras, massacres intermináveis e memórias danadas, até à elevação e grandeza estética em comunhão com os bons sentimentos do plano de conjunto que sela a união para o exterior, onde a bênção de John Ford é recebida nos píncaros, não esquecendo o regresso ao rio com a caravana que passa ao largo, belos bichos escondidos do resto, estamos diante do rolo episódico e longe da Odisseia com requiem ou clímax avesso, definitivo.
 
Destrinçar de um só nó do novelo ou fio de teia que jamais se limpou, onde certos ousados sem medo e de sorriso ao canto conseguem escapar. As guerras civis nunca acabaram, que aqui se proclame uma retirada e um sereno inspirar na turbulenta respiração geral, tem tudo a ver com a não rendição do homem através de um cineasta que nunca se rendeu. Nem quando esculpiu corpos de cera ou estátuas geladas, essa passividade, eternidade, alquimia, romantismo. Para dar a volta por cima. “I decline to accept the end of man”, disse outro valente daquelas zonas. Continuamos aqui, meus senhores.

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