sexta-feira, 11 de julho de 2008

Scob em Franju, Scob em Costa

Era nisto que pensava, na cara de morte de Edith Scob no filme de Franju (cara de uma morta, literalmente) e as afirmações assustadoras de Pedro Costa sobre a presença dela em Casa de Lava.
Está à vista.

(...) Este é um filme mais perdido, não tenho tantas certezas como o João Botelho ou o João Mário Grilo. Para mim, a política é uma coisa subterrânea, um corredor escuro sem indicações que se percorre amordaçado, vendado. E um corredor de morte. Interessam-me mais as marcas e as rugas. Foi isso que tentei fazer com a Edith Scob. Já nos filmes do [Georges] Franju, o que me agradava era ela ser uma menina com rugas. Conseguiu que o "complot" resultasse de uma maneira silenciosa. A Edith Scob hoje é mais actriz de teatro e há um grande reservatório de silêncio nela: por um lado, silêncio de vazio, de esquecimento; por outro, de algo que ainda não está morto. Uma mulher que apesar de tudo não conseguiu ser abatida, que de vez em quando renasce com impulsos, frenesins.

(...) É o ar, o vento do filme. Muito poucas actrizes podem ter tantas idades ao mesmo tempo, podem ser miúdas e velhas. Precisava de alguém que conseguisse resistir à Inês. Não quero ser mórbido, mas a Edith Scob tem na cara a morte inevitável. E a cara dela cinéfila está associada a isso, através dos filmes do Franju. Embora eu nunca lho tenha dito - mas acho que ela o sabe -, o silêncio dela é esse. Quando olha para nós, é a morte que nos olha. E eu precisava dessa morte doce. E uma morte que não aflige.
Pedro Costa

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