domingo, 23 de dezembro de 2012
A um espaço confinado do árido Texas chegou Mac Sledge para curar a imortal bebedeira. Um perfeito ou imperfeito cowboy, evidentemente de rosto fechado, passado duro e uma qualquer fama feita. De um desbotado motel do último degredo vai sair porta fora para fechar chagas, romper novas, avistar um terno horizonte. Mac Sledge, inadjectivável Robert Duvall ainda antes de se ter tornado também ele um dos mais comoventes e fantasmáticos cineastas americanos, habita e aglutina tudo à sua volta com a gravidade do seu olhar tanto lacrimejante e tanto velado e da cepa que o molda. No canto de sereia de um qualquer corpo celeste lá de cima caiu-nos aqui na terra uma fábula da luz para fora da via crucis de dois seres que nada exigiram um do outro, que tudo aceitaram mesmo contra tentação carnívora, um outro de facto um outro. Oferecendo a Bruce Beresford e à sua sensibilidade para escutar o minúsculo no que se perde de ouvido um momento de beleza dos sentimentos e vacilantes ventos comparáveis a um Clint Eastwood desta vida.
Dorida lenta aproximação de um olhar pela câmara que não tem qualquer certeza, sempre resguardando o inacessível e protegendo os sinais vitais. Progressões elípticas que soldam e secam o essencial de um homem e de uma mulher rodeados dos inesperados mortos que chegaram cedo demais. O beijo que só se filma quando o encontro dobra a sua metade. O pudor do para sempre. A filha de Sledge, que eu ainda não disse que é um cantor que se quer voluntariamente apagar matando o álcool e o circo e a esposa de outras vidas, de nome simples Sue e mais triste e ferida como a mais triste das suicidas. O filho da mulher jovem também perdida que ele topou não parece igualmente lá muito feliz. Encontro de perdidos. Entre sempre desgraças todos se podem curar uns aos outros. Olhos feridos com olhos feridos deve mesmo dar em bênção e aos filhos de que estou a falar furará o implacável filho da puta do destino ou para os místicos os pecados que se pagam e seguida redenção.
Coisa já feita esta de um famoso que se entrega a uma anónima, folha virgem aqui. Entre molhos de canções escritas que ninguém ouvirá, o subterrâneo trabalho do rasto da fama, couves cavadas no campo, coluna torcida, generosos afectos, um filme calado porque com a consciência de ser esse par que por já a muito lado ter ido e muito ter enterrado sabe que o que vier é sobrano e assim mesmo lhes resta atirarem-se de instinto e peito aberto para onde o seu fundo mandar.
E por retorcidas e poeirentas e para alguns fétidas estradas, Beresford, o da “Miss Daisy”, vai da treva interior ao arejado futebol final, e, como essa bola que viaja de uma mão para a outra por oxigénios imprevisíveis, ousa mostrar por essa força da fixidez que só guina por inaprisionavel manifestação, que isto de existir é coisa de não ilusão e que a verdade é morte e que a tudo se vai mesmo. Sobre terreno sangrado a américa ontem hoje dos golden hearts que reenvia para todos os outros cantos. Assim sereno. Assim radical. Hollywood genuinamente misericordiosa.
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