sexta-feira, 10 de outubro de 2014



Assim como "Anatomy of a Murder" era segundo Serge Daney o périplo de um parvo (carinhoso) que entre duas de pesca e o regresso à barra do tribunal reaprendia a amar; ou "The Big Steal" a odisseia de outro apressado que não consegue cortar o cabelo na tamanha vicissitude do ofício; "Gideon's Day" trata da Autoridade e da Desautoridade que até aos confins da noite não satisfaz a mulher com o salmão tão desejado. E, nestes casos como tanto em John Ford por este período, as pequenas coisas da vida chegam às grandes e umas e outras já são a mesma coisa no novelo geral. A côdea a saber tão bem como o miolo. As altercações entre Lee Marvin e John Wayne na Taberna Irlandesa como o episódio de Dodge city em "Cheyenne Autumn", não esquecendo descabelamentos à maneira do pedido de casamento marítimo no "Submarine Patrol", comportam o essencial. Desvios da grande engrenagem e da grande história. Estradas secundárias piores que carreiros. Um valente prego no pão na tasca desafamada.

Esquecendo os topos, as irrisões, os escapes, talvez fosse de bom proveito ver as cores de Gideon's em relação às cores de "What Price Glory"; o classicismo à frentex e Shakespeariano de Joseph MacDonald / a guinada do Inglês Freddie Young, companheiro de David Lean e da sua paciência que aqui mais parece um revolucionário operador free cinema em sabotagens camufladas. Para lá, ou cá, nunca o saberemos, da leveza, dos tais episódios sem grande importância ou gravidade, dos peixes fora de água (já não falo só do salmão) ou das lições exemplares, um emaranhado que destapa a rotina, cede posse ao inesperado, troca os eventos e a sua ordem capital; suspende o fluimento e privilegia um ângulo, uma questão e uma sombra alheia em relação ao que vai ganhando peso; enfim, num relativismo que não nos diz que isto não é assim tão mau ou que o sentido é não ter sentido, antes que no meio deste caos à sempre lugar para o quadro em que o empenhado Inspector acaricia e recupera instantaneamente nos braços da sua amada. O beijo da salvação. Manto das redenções. Aparição da tal luz inextinguível da confiança e do amor.

Que saia a correr novamente e que o final rime com os princípios e os meios na tal aceitação do "que remédio", que o peixe na última da hora vá ser comido por outra boca... a cavalgada prossegue, as caravanas continuam a rumar a Oestes novos, os quartos e o amor sempre no contra-campo que será sempre o centro do campo. Ford a mandar às urtigas os arqui-inimigos? Não juro por nada, mas já em 1958 e fora do seu terreno e da sua lenda, ultrapassava a afinação do thriller contemporâneo, o humor macabro do seriado, a manipulação narrativa dos masterminds (continuo a falar de JF e não de Hitchcok). No ano a seguir regressou aos lados e à poeira da Califórnia para filmar como se filmam politicas e junto ao desassombro do Irlandês-Americano de Spencer Tracy. As voltas...

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