terça-feira, 15 de dezembro de 2015


“The Chase”, a obra-prima de Arthur Penn, acaba com o xerife Brando e a mulher a virarem costas a um solo e a uma missão que já fedeu mal demais. “Walking Tall”, penúltima obra de Phil Karlson, começa imediatamente a seguir. Estamos perante um dos filmes mais representativos dos anos 70 americanos – porque um dos seus melhores e metido das unhas aos cabelos na fossa em causa – e absolutamente afastado das imagens de marca, sempre a trabalhar ao lado do instante e da emoção como por aí só me lembro do Richard Fleischer de “The New Centurions”. Joe Don Baker, ex-fuzileiro (fuzileiro para sempre), ex-domador de feras, decidiu voltar as costas ao Sistema para todo o sempre, ámen, e chega a uma nova terra disposto a esquecer tudo e a ser feliz de novo com a mulher e filhos e cão. Só que, deve-se aprender antes do tarde demais, os problemas não passam por causa da terra dar uma volta sobre si mesma nas horas estudadas, as coisas não se esquecem num amanhã perfeito e novo, mas devem resolver-se antes de mais, olhos nos olhos, no agora, questão de vida e de morte sem volta a dar. A aurora de WT é bela, idílica, cheia de grandes-planos pequeninos e a lembrar a candura e os paraísos ainda possivelmente virgens de Robert Mulligan. O pai de família volta à casa de onde nunca deveria ter saído, disposto a não errar a segunda vez dos idiotas, compra o novo lar doce lar, vende as coisas antigas e jura paz e amor. Mas os problemas, como as resoluções de ano novo, não se resolvem mudando as aparências e as superfícies. Imediatamente os planos começam a torcer-se, o clássico cineasta começa a descobrir e a decifrar e a rejeitar o zoom, as lateralidades que a frontalidade e verticalidade sempre desdenharam ganham o quadro, e os fundos e os cancros começam a ganhar posição e a alimentar uma fealdade que não mais parará de crescer entre crânios arrebentados e casamentos para sempre. Daí para a frente essa câmara, o olhar, a encenação a ferros domada, dirigida, torna-se fazedora de justiça, ora expondo para si as leis sempre ambíguas e fantásticas dos homens, ora entrando em terrenos Salomónicos. Don Baker entra onde Brando tinha estado na fúria triste de Penn e junta um negro clamante de comunidade e uma prostituta a morrer de solidão que pede um só carinho, um só que seja. Os tiros entram nos quartos das crianças, nas cabeças dos amados, a papelada vira o feitiço contra o feiticeiro, a beleza é cuspida e emporcalhada por quem não mais viu um sol a bater num lago e tais revelações, uma criança vai à cama do hospital amarrar a mão do Pai e uma arma lamentosa que nunca poderia ter sentido nessa composição mas que tem pois o mal passou a fronteira permitida; a explosão final coloca alguma coisa no devido lugar, unindo finalmente o inseparável. A personagem mais abjecta do filme, aquele monstro engravatado que fala do choque entre o idealismo e a realidade como se fosse coisa para gozar, personagem que de certeza criou os tipos dos disparos gratuitos, vai ver nessa catarse redentora a nulidade da sua fórmula. Quando a Comunidade se faz um universo genuíno, infinito e sublime – mais do que justiça Salomónica é o natural em evolução – o sonho e o seu contrário, o possível e o impossível, utópico ou terreno, perdem a significância, mais do que isso, a convenção, para se alcançar o equilibro primitivo onde se deveria ter permanecido. O princípio, e quem tem razão já é o genérico final com o olhar para trás de Don Baker e a música de Johnny Mathis. Fabuloso, sobretudo porque a força da natureza e a moral, as coisas e os seres, se formaram um. O princípio. Daqui e da ponta mais longínqua.  

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