domingo, 5 de julho de 2009



Vila do Conde, olé.

“The Limits of Control” até pode não ser o melhor Jarmusch – não é, com certeza – mas é certamente uma guinada surpreendente em relação aos seus últimos filmes, uma espécie de regresso a algumas coisas que só ele fez pelos anos 80. Muita viagem longa, aeroportos, comboios, situações repetidas, e, preciosíssimo, único, uma calma, mas uma calma mesmo, que a maioria dos outros filmes já perderam ou não ousam. Ou não lhe deixam ousar. Ou estão de tal modo contaminados pelas dominâncias que em tal nem pensam. Enfim, está-se mesmo a ver que é filme para muita muita gente escrever: “Jarmusch já não têm nada a dizer” ou “existem limites para a auto-indulgência”. Ou as típicas que já ontem ouvi: “há limites para aguentar estes filmes”. “Uma seca” dizem eles.

Pouco importa, quem tem esta autonomia e esta capacidade para mandar foder todas as imagens, sons e fórmulas narrativas contemporâneas, mesmo tendo o descaramento de citar abertamente obras seminais como “Point Blank” de John Boorman, “Le samouraï” de “Jean-Pierre Melville” ou trabalhar os complots de maneira idêntica a muitos dos filmes de Rivette, dos anos 80 principalmente, e mesmo citando tudo isto, permanecer tão fresco e com tanto interesse pela descoberta dos novos mundos percorridos pelo fabuloso e insondável Isaach De Bankolé (Lone Man, homem de poucas palavras ou nenhumas e obviamente samouraï) pelos costumes locais e pelos ritmos singulares de cada zona, só pode ser fundamental no cinema de hoje. Pelo menos para mim, nunca quis convencer ninguém.

O que Jim faz é um daqueles filmes de investigação, de mistério, como tanto se fez no cinema clássico e afins, um homem sozinho com uma missão, só que, obviamente, faz tal coisa à sua maneira, ou seja, coloca sempre a sua câmara no ângulo onde jamais as regras o ditariam, onde jamais o produtor deixaria, filma sempre os momentos e as acções elididas pelos argumentos e pelas planificações típicas, filma as respirações e “o espaço entre as coisas” que a indústria considera importante e decisivo para as audiências perceberem as histórias. E as elipses, elipses que por si só mereciam um tratado, os enigmas e os rasgos por elas criadas, aquele magnífico e fantasioso final, um corte e está feito o espectáculo, impagável. Ou seja, sempre ao lado de, à margem de. E claro, porque o tempo e a duração lhe dizem muito, gasta sempre muito mais película por plano do que os 2/3 segundos do resto do cinema americano. Dizer “action” e logo “cut” é bastante cansativo, benditos os cineastas que sofrem de tal cansaço ou da tal vicio…

E o resto é o resto, obviamente, e em abono da verdade existem coisas no filme que não gostei mesmo: as câmaras lentas aplicadas a algumas personagens e em algumas outras imagens, a maneira como essas mesmas personagens são filmadas ao irromperem, e até esse lado quase “arty” como alguns planos são ligadas. Mas repito, repito mesmo, foda-se, gestos de liberdade destes e quadros destes – os mais belos quadros dos seus filmes, é impossível Jim não ter visto uma retrospectiva dos filmes do Pedro Costa, os contra-picados aos céus e às torres são Ventura em “Juventude em Marcha”; a forma de filmar aqueles pequenos bairros é “No Quarto da Vanda” – um tal olhar impassível sobre o que se filma, sobre o que existe, e olhares magoados como os que vão sucedendo – o filme trata muito bem e de maneira bem sui generis uma espécie de desilusão ao mesmo tempo contemporânea e mítica – é qualquer coisa como mais um pouco de ar e mais um pouco de esperança para continuar a ir ver cinema ao cinema.

Tilda Swinton? Paz de la Huerta? Youki Kudoh? …les femmes sont belles.

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