Acto da Primavera
1963
No primeiro destes fotogramas, Oliveira está à câmara; no segundo vemos o «objecto» do seu filme: a paixão de Cristo, mais concretamente, o episódio da crucificação, com Cristo ladeado pelo bom e o mau ladrão. Acto da Primavera é, para o cinema português e para o cinema contemporâneo, um filme primordial. Assim o tinham sido, também, as diversas «vidas de Cristo» filmadas na origem do próprio cinema, porque a segurança da história permitia aos cineastas concentrarem-se, essencialmente, na criação das imagens e do movimento. Neste filme, Oliveira alarga muitíssimo os limites desse «jogo», articulando a paixão, não só com a sua representação em auto pelos camponeses da Curralha como, também, com o quotidiano documental da aldeia e com o modo de fazer do próprio cinema. Nunca mais, em Portugal, se perdeu este gosto rebelde e moderno pelo cinema como acto de travessia dos vários planos – por vezes, dissonantes – que dão corpo à realidade. O Acto é um filme fulgurante, habitado como está, no centro do seu infinito «teatro de ilusões», pela presença misteriosa (milagrosa) do próprio Cristo.
J.M.G
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