quinta-feira, 4 de julho de 2024

The Bikeriders, de Jeff Nichols




Jeff Nichols quis fazer do trabalho fotográfico de Danny Lyon um filme cool. The Bikeriders é um filme cool. Demasiado. E talvez por isso, por querer captar uma atmosfera demasiado vaga, demasiado mistificada, com uma aureola viciada, seja o filme menos puro de Nichols. E como Nichols é um cineasta puro, um contador infantil único, um miúdo do risco, é pouco o que conseguiu. A estrutura fragmentada e semi-documental é demasiado óbvia (lembramo-nos logo de outros filmes e séries que a usam melhor) e enfraquece a possível voltagem, a ebulição e a altercação. As figuras de estilo roubadas – dos sobressaltos e dos êxtases scorsesianos (e revistos pelos seus ídolos)ou o uso convencional da música – viciam uma sensibilidade que em obras genuínas como Mud ou Take Shelter florescia sem proteção de estilo. Mud – a sua obra-prima – é o Mark Twain de Tom Sawyer e Huckleberry Finn vividos, recontados e aventurados por Nichols e pelos seus actores e equipa em pleno campo. Milagre e terror de um único ser e de milhões deles. Os olhos e o coração do ser em formação das ecografias obstétricas a fazer o balanço de alguns anos de luz… 

The Bikeriders tem um Tom Hardy que nos oferece todo o peso de uma alma no fardo de um corpo já corrupto demais para redenções prontas-a-servir – e lembra-nos os homens assim tão puros, porque viciados sem cálculo, que fomos conhecendo e amando calados – estilhaços de outras almas assim errantes que produzem o movimento inverso de uma explosão cósmica ao se concentrarem no corpo de um magnifico actor; e uma Jodie Comer que é uma surpresa de comoção magoada pelos brilhos fugazes que entreviu mas não amarrou e que se pergunta constantemente se a culpa foi sua. As melhores cenas dela são com Hardy, almas gémeas simétricas que se perfazem. Austin Butler, infelizmente, é um mito vazio e sem brilho, mera silhueta a que a ternura de Nichols não chega (porque longe das persistências anteriores da memória, dos sonhos e dos pesadelos de todos os seus filmes irrepetíveis?).

E por Hardy e Corner The Bikeriders merece visões e revisões.

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