sábado, 5 de abril de 2008

Divina Comédia, mais uma vez



Volto á Divina Comédia do Senhor Oliveira, tenho que voltar.
Se neste filme estamos furiosamente perante a sua moral de ferro da mise en scene – cúmulo da sua filiação asceta, frontal, no que á colocação da câmara e elaboração do plano diz respeito, é porque todos os propósitos em causa o obrigam, não pode ser de outra maneira. A decoupage segue o mesmo caminho, retribuir o direito originário á personagem.
Como diz o cineasta, quando lhe perguntam como escolhe o sítio da câmara: “se não é ali ou acolá é aqui”. (cito de cor)

A frontalidade como ética de um mundo de todas as ambiguidades e de todo o inexplicável. Dito isto é também o mais surreal dos seus filmes, sempre á beira do abismo, do estremecimento cósmico, é o abalo do confronto entre todas as crenças e desconhecimentos, todos os antagonismos.
A música de Maria João Pires como ordenadora de prenuncio de loucura e de catástrofe, mas também como espécie de apaziguante no caos.
Tudo de uma riqueza inolvidável, e o plano inicial de Adão e Eva com a serpente, está para lá de Dreyer, Bergman, Losey ou Straub (as sempre citadas referências) para se situar no mais inacessível dos limbos.
Deixo-vos a imagem dissonante de todo o filme, ligação impossível entre o cinema de Manoel de Oliveira e de Leos Carax.

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