sexta-feira, 26 de dezembro de 2014






Em "Pinky" começa por ser a pele e a carne que ordena, a instituição, o mito. Depois, pela persistência e pelo ajuste de contas mais antigo e sanguinolento do que o supracitado testamento, tudo começa a retroceder até à nudez, ao pó e osso. Passa-se a olhar para os vazios, plana-se no etéreo suplicante, atinge-se o espírito amainado. Impõe-se, à força de vencer a morte, a eternidade. Olhar nenhures, suprimir o nada, chegar ao absoluto sintético da crença. E todos os seres, lugares, ideologias ou politicas ficam sem referente. Cinema é imprimir toda a vida no mesmo rolo - recuperar as coisas perdidas e impossíveis, apreensão divagante e precisa: a criança tão cansada aos ombros heróicos do pai, o colo primordial do seio, redenção do derradeiro abraço sem aviso, as olhadelas para o leito seguro, os olhares e revirares das vigílias e dos sonos vigiados, diálogos sem palavras, salvação mútua, a ascensão sempre nova do astro matricial como os declinares em sombras nas marcas gravadas na parede e na recordação; tudo o que o tempo diz que não é suposto possuir duas vezes. Uma última olhadela, só mais uma, e a eternidade. Elia Kazan recupera tudo isto e o seu movimento, a sua duração, quimérica - apelidado lirismo. Mas não, não é o lirismo forçado e escrito, sim aquele que rasga e resgata da treva arrumada. Kazan precisou do "long shot" de John Ford para apelar e conservar o sacral, aquilo que fica depois da passagem permitida. Aos grandes, pois desamarrados da época que só nela escavaram, foi-lhes permitido isso. Explodindo a tremedura exterior que larga do interior insondável. Deve ser esse o "método" fundamental dele e dos seus outros.

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