quarta-feira, 30 de abril de 2008

Filmes-espertos…

É verdade, em 1972 já os havia. O conceito é mais ao menos meu e pensava que era uma praga dos anos ano noventa, inspirada pela lógica dos jogos de vídeo, por certos programas de televisão, jogos de chá das cinco, etc…
Para resumir: os filmes de Spike Jonze com argumentos de Kaufman; O Sexto Sentido de Shyamalan e aquele seu final divino; coisas de Grondy, de Noé; O Jogo de Fincher (o titulo é o mote, seu programa e resumo global), etc…
Ou seja: filmes que eu escreveria se estivesse pedrado, não é difícil ter-se a ideia estúpida de por pessoas a entrar na cabeça de alguém, literalmente (mesmo apesar de ter demorado 100 anos). Para que servem estas coisas? Ou para se ver drogado ou então para, rigorosamente, nada. Não diverte, ainda por cima, e as formas já eu as conhecia dos clipes de publicidade e de música que esses senhores faziam antes de se terem tornado cineastas.
Em 1972? Sim, Sleuth de Mankiewicz, é um proto cinema espertinho muito antes do seu tempo. Na década da paranóia e da desilusão do sonho americano, o cineasta decidiu adaptar a peça de Anthony Shaffer (adaptada por este mesmo senhor) a cinema.
O resultado tem toda a lógica que enunciei: jogo de máscaras, de espelhos, o escritor que pretende comprovar a eficácia dos seus escritos, o oponente que se torna surpreendente mais esperto que o velho mestre, o tempo a apertar, o salto de plataforma em plataforma, etc…etc…
Serve para alguma coisa? Não; Diverte? A mim custou-me bem mais do que a versão longa dos Senhores do Anéis. E o trabalho formal? A câmara é elegante e a montagem é bem funcional, mas tudo já estava viciado à partida e nem mesmo isto, e os brilhantes actores, há que referir, servem para dizer que este filme é um dos pronuncios da catástrofe que assola o novo (o dos jovens…) cinema americano.
Ainda por cima existe uma versão de Kenneth Branagh…livra.

"Na minha infância, a América era como uma religião. Durante a minha infância e adolescência eu sonhava com os espaços abertos da América. Os grandes espaços de deserto. O extraordinário "melting pot", a primeira nação feita com pessoas de todo o mundo. As estradas a direito, compridas - muito poeirentas, lamacentas - que começam não se saber onde e acabam não se sabe onde, porque a sua função é atravessar um continente. De repente os americanos de verdade entraram na minha vida - em jipes - e perturbaram todos os meus sonhos. Vieram libertar-me. Achei-os muito enérgicos mas também muito decepcionantes. Já não eram os americanos do Oeste. Eram soldados como quaisquer outros, com a única diferença de que eram vencedores. Homens materialistas, possessivos, senhores dos seus prazeres e dos bens materiais. Nos GI que perseguiam as nossas mulheres e vendiam cigarros no mercado negro eu não conseguia encontrar nada do que vira em Hemingway, Dos Passos ou Chandler. Nem em Mandrake, o mágico do coração grande, nem em Flash Gordon. Nada - ou quase nada - das grandes pradarias, ou dos semideuses da minha infância."

Sergio Leone

super estrela

"Sabe, não é tanto gostar do Indy como é gostar de trabalhar com Steven [Spielberg] e George [Lucas] e fazer este tipo de filme e ter a oportunidade e interpretar uma personagen com esta variedade e esta experiência e com o potencial para explorar tanta coisa. A cada dia de filmagens, todos tínhamos ideias para este tipo, estimulantes para mim como actor, e, espero, estimulantes para os espectadores. E tivemos os melhores actores, o melhor director de fotografia, o melhor "catering", foi tudo... Foi um banquete, um banquete em forma de filme."

Harrison Ford

...

juro que se tivesse sido Steven Spielberg a dizer isto não ia ver o filme. Ou Harrison estava eufórico ou então é um arrogante sem consciência do estado das coisas, do mundo. Enfim, acho que Spielberg nunca diria isto.

Jean - Luc II

The next day at Cannes: Godard met the press, a much-depleted group from the screening. When the French moderator started the occasion by noting, "An Anglo-Saxon critic once said, 'In Godard, there is God,'" the iconoclastic filmmaker shook his head in exasperation, and lit a cigar. And braved himself for the first question from a journalist: "Why do you never allude to e-mail or the internet?"

"You mean talk about e-mail in my films?" Godard inquired back. "I'm not the right person to ask that question. I still have my very old typewriter. I bought 12 models of that typewriter which will take me to the end of my life. Typewriters were invented for blind people, so that's exactly what I need. As for the internet, I can't give you an answer. I don't use it."

On attacking Spielberg in this movie for appropriating Holocaust history: "I've never met him, I don't know him, I'm not so fond of his films, and at the time I was critical of him when he reconstructed Auschwitz [for Schindler's List.] As an artist and auteur, I felt it my duty to point a finger at him."

On why he doesn't like Spielberg films: "That would take too long to explain. I no longer enjoy making comments in my work about films from the past. Show me a film in a screening room, then I'll make comments."

Jean - Luc



(...) A metralhadora verbal de Godard continua atirando em todo mundo. Depois de martelar o documentarista Michael Moore (Fahrenheit 11 de Setembro) e o cineasta Gus Van Sant (Elefante), Quentin Tarantino é o atacado da vez. Godard também não tem poupado Hollywood de sua artilharia. Em Elogio ao Amor, um personagem diz que o cinema americano está contando a história de todos os povos e, assim, altera os contextos conforme necessidades de ocasião. Em Nossa Música, volta à bateria. Alguém afirma que ganha as guerras quem ganhar o relato sobre elas. (...)

ÉPOCA - Nossa Música faz alusão ao conflito no Oriente Médio. Qual a ligação entre Sarajevo, onde se passa parte do filme, e a situação atual entre Israel e os palestinos?

Jean-Luc Godard - No filme, uma jovem personagem israelense vai a Sarajevo porque acredita que talvez encontre um exemplo de reconciliação entre dois campos adversários.

ÉPOCA - O senhor cita Celine em Nossa Música (''Os fatos não falarão por si por muito tempo''). Perdemos a capacidade de análise de um fato?

Godard - Acredito que sim, porque não sabemos muito bem utilizar a imagem ou não queremos utilizá-la bem. Nós nos servimos somente da palavra, porém também não sabemos empregá-la como fazem os poetas e alguns escritores. Não sabemos mais misturar as duas: imagem e palavra. Não existe diferença entre um livro e uma imagem. A poesia é feita de muitas imagens e imagens podem ser cheias de texto. Mas nós perdemos também a capacidade de utilizar a palavra. Falamos muito, mas isso é mais um sinal de impotência. A palavra hoje está ligada à técnica, à eletrônica, à química, a outras coisas, menos ao pensamento e à reflexão.

ÉPOCA - O senhor já definiu Nossa Música como uma conversa.

Godard - Não é uma conversa que pretende resolver tudo. Minha intenção era filmar um israelense e um palestino discutindo juntos sobre coisas práticas. O encontro se passaria dentro de um apartamento, sem ter respostas imediatas. Esse filme não demonstra nada, somente que é possível dialogar.
ÉPOCA - Considera-se um ativista político do cinema?

Godard - Não falaria mais de militância política, mas de situações das quais me sinto próximo. O território onde ä atuo, que é a fabricação de filmes, ficou muito colonizado por uma maneira única de pensar. Essa maneira vem de Hollywood, aliás, do que se tornou o cinema hollywoodiano. Isso significa que, cada dia mais, perdemos nosso espaço, nosso território, nossa maneira de pensar e imaginar.
ÉPOCA - Mas a Nouvelle Vague não nasceu da idéia de uma nova maneira de fazer e de pensar o cinema, uma forma de lutar contra a uniformização?
Godard - A Nouvelle Vague quis fazer isso, mas não conseguiu. Outros fizeram de maneira individual. Houve uma época em que a Nouvelle Vague apoiou os filmes feitos por Hollywood. O problema é que mesmo a pequena produção independente de Hollywood foi uniformizada. É o que deseja o público no mundo inteiro. Todos têm muita coragem para viver sua vida, mas não possuem coragem para imaginar.
ÉPOCA - Existem imagens justas?
Godard - Não. Existem apenas imagens que formam um conceito, que é um pouco mais justo em relação a uma situação específica.
ÉPOCA - O nome da produtora de Quentin Tarantino é Band a Part, título de um de seus filmes. O que pensa dele?
Godard - Eu acho o trabalho dele nulo. Ele escolheu o título de um dos meus piores filmes para dar nome a sua produtora. Isso não me surpreende em nada.
ÉPOCA - Godard é um mito?
Godard - De jeito nenhum. As pessoas assistem pouquíssimo a meus filmes e mesmo assim eu sou um pouco conhecido. Um mistério.
ÉPOCA - Em Nossa Música o senhor, em seu próprio papel, afirma que matar alguém por uma idéia é, antes de tudo, matar alguém. A violência não pode ser uma forma de reação política?
Godard - Depende. Penso que alguém que está muito doente, com Aids ou câncer, deve se violentar para continuar a viver, em vez de abandonar a vida. Isso para mim é uma boa violência. Uma outra forma de violência, tais como muitas que são difundidas por muitos filmes e regimes políticos, não é uma boa violência. Pode existir também uma violência de reflexão. Sócrates era muito violento em sua reflexão, mas era um pacifista.
ÉPOCA - As imagens estão muito parecidas hoje?
Godard - Todo mundo é parecido no cinema. Se alguém filma um carrasco nazista em um campo de concentração e filma sua vítima, vai filmá-los da mesma maneira. É o que as pessoas chamam de democracia.
http://revistaepoca.globo.com, Godard acima do bem e do mal,
ERICA CAMPELO, DE PARIS
COLABOROU CLÉBER EDUARDO

terça-feira, 29 de abril de 2008

Umberto

Os quatro anos que medeiam Ladri di biciclette (1948) e Umberto D (1952) é o da queda de uma palavra, o que equivale dizer a uma entrada noutra realidade. Ou seja, cai o Neo, fica o Realismo. Ladri era puríssimo na forma como o meio aparecia de forma bruta, crua, suja. O contrário do idealismo Americano. Umberto, é pois, certamente um dos pontos de viragem do cinema italiano. No mesmo ano Rosselini fazia Europa´51 e fechava as contas, Visconti seguia trajectória idêntica, etc…
Repare-se como a personagem principal, prodigioso Carlo Battisti, sofre, sofre muito, mas sempre um sofrimento digno, moralmente tocante, e como dúvida, se dúvida…
O génio e a compreensão de Vittorio De Sica é como que assimilar e apreender o tempo e construir uma forma que aumente ainda mais o humanismo e a dignidade da improvável personagem Bigger than life.
A arquitectura das imagens é notável, algo entre as escalas de Welles serenadas pelo cinematógrafo de Bresson, e o que arrepia é mesmo isso – um homem, um cão e a sua nobreza mais que tudo, inseridos num meio esculpido sabiamente, pacientemente.
É tudo doce no mais do que amargo, não tenho duvidas, os Straub e Costa passaram por aqui.

Para finalizar algumas questões colaterais…


- a 1000 Ridley Scott´s, fico com um Ted Kotcheff!
- a 1000 Darren Aronofsky´s, fico com um Enzo G. Castellari!
- a 1000 Christophe Honoré´s, fico com um Leos Carax!

Porquê?

Especificidades cinematográficas; humildade; despretensão; savoir faire; “não quero ser génio, quero ser cineasta”; “não quero ser emulador, quero ser profissional”, a Nouvelle Vague já acabou; “não quero fazer filmes para a galáxia, quero fazer sobre a galáxia (substitua-se por mundo)…

outra História Americana...



Ted Kotcheff's First Blood is the story of a burned out Vietnam Vet, who after being trained as a Green Beret, and decorated with several metals of honor, has been dumped back into society and left to his own devices. Though generally a mild mannered individual, he has been trained not to be pushed. So when a judgmental Sheriff mistreats him, he brings the war to this small town, and this time he wants to win.

This film was filmed in Hope, British Columbia, though it is meant to take place in the Northwestern United States. Adapted from David Morell's novel, this portrays John Rambo as a much more sympathetic character than the book, and shows the Sheriff as much less Sympathetic, and certainly less developed. When Rambo first has the run in with Sheriff Teasle, all of the shots seem to favor Teasle. When we see Rambo it is from a low angle, as if it were Teasle's POV, and when we see Teasle it is at eye level. Kotcheff might have, in my estimation, done this for one of two reasons.


1. Perhaps he wanted to balance out the Sheriff's role which was dramatically chopped, and allow us to see things from his point of view a little bit more.

2. He might have been playing a gag on the audience, where we are used to cheering for the law, he might have been trying to trick us into thinking the hero was Teasle.

This film has been criticized for having a weak story, but for those who actually take time to analyze it we see a very thoughtful story there. Playing Mythological images throughout, such as the cave the hero descends to, and the flaming sword (when he uses his knife as a torch), it has universal appeal. The high stakes in this film are dealing with internal demons, not external, which is primarily why people who look only on the surface of films criticize it, along with the commercialized sequels to follow.

The look of the film is very raw. Costumes are simple, using primarily and earth tones as. The sets are almost all outdoors, and generally also have a gritty feeling. The film is also quite dark at times, but the new DVD transfer is very good, so it is not too dark at all. The frames are very alive, and staged deeply. Rarely do we see a frame that does not convey depth. We see some handheld work at tense moments, and from the beginning of the second act the action does not seem to stop.

Not a lot of research has been done into Ted Kotcheff's style, but after viewing both First Blood and Uncommon Valor, There seems to be heavy influences from both Akira Kurosawa as well as Alfred Hitchcock in Kotcheff's work. In First Blood, here are some of the attributes we find that Kurosawa was known for:

- Camera is not close to the sight line
- There are often frames within frames
- The expantion of time is used to build suspense, followed by bursts of action
- Multiple levels of action: Foreground, middleground, and background action, and they are often separated by the frames within the frames.
- Dolly across the action
- Use of long lenses
- Deep depth of field
- Action seen through frames - we really see this when we see the soldiers fire at Rambo through the frame of the mine shaft, which is a lot like shots in the Seven Samurai

Expansion of time is used very cleverly in this picture. It holds tension very effectively. One example of this is when we PAN with soldiers and stop on an open frame of rocks and a stream. We hold on this shot for a few seconds, and just when we are about to fall out of the story we see a hand raise up from the lake. Another good example of this, as well as Stallone's acting achievements in this movie, is when Rambo is sleeping and we hear Trautman over the radio. We hear him, and Rambo flinches a little as if he is just dreaming. He hears the voice again and suddenly wakes up. Then there is silence, while Rambo still thinks he may have been dreaming, and then the voice comes again and Rambo suddenly looks over to the radio.

There are also some interesting plays with the point of view used in this film. We see Rambo walk into his own point of view near the end of the movie, which is something Hitchcock liked to do, but we also sometimes PAN someone into their POV, as when Rambo first sees the Sheriff pull up, we think it is his point of view, then we PAN and Rambo is standing there right in his own point of view.

In the final moments of the movie Rambo runs off a tremendous speech, one that in my opinion has never been matched cinematically. First of all the delivery is meaningful and honest. Also because Trautman directly prior to this talks about this "War" that Rambo started on the town. Rambo starts talking about the war as well, only he is talking about Vietnam. At the end of it he pulls Trautman down and embrases him. All he really needed was one person to care for him.

One of the shots we see a lot in this film is Panning with the action. By this I mean for example a shot of a vehicle coming towards us, then pan with it as it passes by and then moves away from us. This does a few things. for one it keeps us with the action, it also creates a dynamic- always moving frame, but above that, it also gives us a lot of scope, and allows us to see more of the world, and maybe believe that there is life beyond the edge of the frame.

Sound is another important element in this movie. At times we see Stallone react to dogs in the distance that were obviously not there when it was shot. We also hear the sound of bullets firing when the gunshop is on fire. Even though we do not see the bullets flying we believe they are.

First Blood I find is one of those few modern movies you can watch and both enjoy, and learn something as well. Having watched and recorded every shot in the movie, I feel I have grown beyond what I thought I could just by seeing the film. If you like First Blood, I also recommend watching Uncommon Valor, Seven Samurai and Notorious.

Essay by Shawn Buffington

...

...continuo impressionado com o esquecimento em relação á arte de Ted Kotcheff, bastaria este admirável filme sobre a ressaca e a desilusão de um homem que viu o Vietnam, onde tudo é tão formalmente e humanamente seco e humilde para estar ao lado do grande cinema clássico das desilusões de uma nação...

segunda-feira, 28 de abril de 2008

depois da colina e da tempestade, tudo...


- Ain't you going back, Abe?

- No, I think I might go on apiece...

- maybe to the top of that hill.

Ran


a poesia no sangue, o sangue na poesia…o vento, as nuvens e o céu, as curvas e planícies …as crenças e as descrenças, a fidelidade e a traição…ai aqueles castelos...
…dito isto, ou visto isto, tenho pena dos bonecos de Peter Jackson , da impotência de Lucas, dos saltos de Neo ou do coliseu de Scott.
1985, Akira Kurosawa

James Gray, ainda...

Como foi possível um critico como João Lopes ter escrito tamanha contradição, disparate mesmo, aqui:

“Ainda lembrando Scorsese, mas... ao contrário: James Gray filma «We Own the Night» (sobre a máfia russa em Nova Iorque) como uma espécie de derivação temática e formal de alguns títulos clássicos de Scorsese, incluindo, claro, «Tudo Bons Rapazes» — o resultado oscila entre a pompa e a vulgaridade, mais parecendo um episódio de rotina de uma série policial para televisão.”


Lamentável é dizer pouco, deste ridícula comparação. Pois bem, todos sabemos, e o João Lopes sabe muito bem, que o factor que anima e dá vida ás formas de Scorsese é uma espécie de fogo, uma fúria descontrolada; resumindo, basta lembrar o título da crónica escrita por Serge Toubiana na Cahiers du Cinema nº500 (precisamente dedicada a Scorsese): “Un processus de démolition”.
De resto o próprio cineasta sempre confessou que filmou a última parte de "Tudo Bons Rapazes", com o ritmo e o speed da droga. De resto é fragmentações a toda a linha, música a explodir, improvisação constante, etc…

Muito bem, Gray é completamente o contrário, em qualquer um dos três filmes. É estático, detentor de uma moral frontal e quase ascética no que ao posicionamento da câmara diz respeito, é lento e carregado no evoluir das tragédias, compões quadros de riquíssimas composições e texturas.
As suas narrativas são completamente lineares, não há um só truque de narrativa, como não existem piruetas estilísticas.
É nos pormenores que tudo se decide: a escuridão da personagem de Charlize Theoron em "The Yards"; ou o momento em que na discoteca, Phoenix, antes de ir confirmar a qualidade da droga, acende um cigarro com um fósforo.
Gray é o pronuncio calmo e concentrado da tragédia. Scorsese é um processo ultra violento, urdido da sua pulsão originária e das suas referências indecididas: de Cassavetes a Fellini, entre dezenas de exemplos.
E não se chame aos filmes de Gray, “filmes de mafiosos”, pois a essência é outra e mafiosos há em quase todos os filmes.
A coisa da televisão não comento, nesse ponto não há consciência…

Spellbound


Sobre Spellbound, 1945, filme realizado cinco anos depois da chegada á América do prodígio Inglês, muito se discuti, bem vistas as coisas, nunca foi dos filmes mais apreciados de Mestre Hitchcok.
Os defeitos vão desde uma história inverosímil a uma fraca interpretação de Gregory Peck, resolução premeditada, braço de ferro com David O. Selznick, etc…
A “coisa” mais que se costuma louvar é a sequência do sonho desenhada por Dalli.
Lembro-me de Benard da Costa o ter inserido, aqui há uns anos, no ciclo Hitchcok, na rtp 2, foi o único que falhei, mas ele disse muito bem…
E é óbvio, é coisa grandiosa, ao lado de qualquer um dos grandes.
O mais impressionante é a forma como elementos tão completamente fugidios, escuros e dispersivos (psicanálise, sentimentos de culpa, bloqueios, etc…) são de tal modo emplacados, inserido numa dureza formal em que o quadro nada mais é (e é tudo) que o espaço onde todas as sombras e interrogações habitam e dentro dele (no quadro) são fechados para hiperbolizar o questionamento e aumentar a pressão aos limites.
A tal ciência da mise en scene aplicada á ciência de curar o pesadelo, ou seja, tudo é justo, cada enquadramento e movimentação de câmara é essencial e moralmente incorruptível. Culpa/medo/; Hitchcok; Lang. O oposto, por exemplo, da tentativa redondamente falhada do último Coppola (WHW).
Gregory Peck está perfeito no homem que primeiramente convence, mas que logo depois, revelado o mal, transmite dolorosamente aqueles momentos em que o raciocínio e a lucidez são sugados, para lhe inserir pulsões desconhecidas que o deixam de rastos – arrepiante interpretação.
Depois o final muito pouco interessa, o mestre parece marimbar-se e pôr a claro o cerne da sua crença ética/formal: a tal perfeição da forma que logo se dilui/destrói para emergir o centro filmico.
É como se toda a obra engrenasse ou girasse sobre o famoso mcguffin, para nos dar um sublime estudo dos casos clínicos em questão e uma magistral lição de pôr em cena.
Sim, pois aquela descida na neve ombreia perfeitamente com o maior dos momentos altos de outro seu qualquer filme.
Para além da sequência surrealista, todo um mundo do humano e de cinema.

domingo, 27 de abril de 2008

Die Ehe der Maria Braun

Fabulosa Maria Braun (Hanna Schygulla), como Dietrich com Sternberg, é a mulher de tantos rostos, de tantas paixões e de tantas farsas. Gélida, segura e consciente do seu poder de atracção, tudo leva á frente com a fixidez da sua ideia.
O final fica como um manifesto de saturação impossível da farsa.
È toda esta simplicidade com que Fassbinder vai entrelaçando os palcos e a função ontológica original da câmara (observando e sacando as acções e as emoções, uma realidade), em surdina, sem excessos nem gordura – apesar das esporádicas estilizações, que só estão lá para confirmar embustes – que retira mais uma vez o Melo ao Drama (tanto quanto substitui qualquer banda som pastosa, por um relato de futebol) – mesmo com o pano de fundo politico e social – e torna o percurso paradoxalmente apaixonado e cínico de Maria em algo perturbantemente apaixonante.

1979

...my blade without runner

Alphaville, une étrange aventure de Lemmy Caution, Jean-Luc Godard, 1965

sábado, 26 de abril de 2008

não consigo…


…gostar de La Strada. Deixa-me frio, gelado, nem sequer admiro á distância, que é como eu costumo admirar Fellini.
Sim, é intimista, filme de metáforas, percursos, cortes e descobrimentos, final emocionante e tocante. Mas tudo parece que se passa mais da parte de trás do quadro, ou nas bordas, do que em primeiro plano, nas personagens, na carne e nas expressões. E isto num filme em que as farsas e grandezas do circo estão constantemente dialéctizadas com o movimento da vida.
Não consigo mesmo – nas tangentes surrealistas e mágicas em que se poderá aproximar o cinema de Fellini e o do Bunuel, amo o do espanhol, admiro o do italiano.

Eclisse

Em tempos de apoteótica exaltação a Blade Runner, e sabiamente guiado por Martin Scorsese, apeteceu-me rever L`Eclisse, um dos cúmulos da arte de Antonioni (o meu italiano favorito a par com Rossellini).
E sem fazer por isso pensei muito no filme de Scott – que só vi uma vez e não tenho vontade de rever – e cheguei á minha conclusão: está aqui tudo o que Blade tentou, o seu âmago.
A visão apocalíptica, uma espécie de assombração terminal, os encontros impossíveis, a alienação, etc…
Só que o Mestre Italiano sabe como por coisas destas, serenamente e sem os fumos e a sujeira que tanto fez história no Blade, em cena.
Em Blade está tudo, paradoxalmente, tão dilatado e óbvio que a mim não me causa qualquer impacto, pelo menos não ficou nada.
Em Eclisse só temos o essencial – a mise en scene que serenamente cria um vazio total, onde dentro do quadro só existe espaço para divagações corporais, para os não ditos apesar das tentativas, para trajectos sem rumo, para a tal constatação de impossibilidade de qualquer sentimento…
Mesmo com tempos e, se quisermos, noções estéticas aparte, o murro no estômago é de outra pujança.

Tu n'as rien vu à Hiroshima

animação



Na entrevista do ípsilon a Harmony Korine – esse o verdadeiro Herói independente – para lá de tantas coisas tocantes, retive o facto de ele ter dito que nunca gostou de filmes de animação.
Korine: eu também não. Aliás, o único filme de Charles Laughton, em particular esta cena, passou a ser a minha animação favorita desde que o vi há uns anos. Lembro-me que uma pessoa bastante importante para mim lançou primariamente essa ideia de animação neste filme.
O mesmo para Burton e muita da sua obra de imagem real.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

On Abjection

Jacques Rivette

translated by David Pratt-Robson with the assistance of Jeremi Szaniawski

KAPO, Italian film by GILLO PONTECORVO. Script: Franco Solinas and Gillo Pontecorvo. Cinematography: Alexander Sekolovic. Music: Carlo Rustichelli. Cast: Didi Perego, Gianni Garko, Susan Strasberg, Laurent Terzieff, Emmanuelle Riva. Production companies: Vides, Zebro, Francinex, 1960. Distribution: Cinédis.

The least that one can say is that it's difficult, when one takes on a film on such a subject (the concentration camps), not to ask oneself certain preliminary questions; yet everything happens as though, due to incoherence, inanity, or cowardice, Pontecorvo resolutely neglected to ask them.

For example, that of realism: for so many reasons, all quite easy to understand, total realism -- or what serves as realism in cinema -- is impossible here; every effort in this direction is necessarily unachieved (that is immoral), every attempt at reenactment or pathetic and grotesque make-up, every traditional approach to "spectacle" partakes in voyeurism and pornography. The director is bound to make it tasteless, so that that which he dares present as "reality" is physically tolerable for the viewer, who can't help but conclude, maybe unconsciously, that, of course, it was troublesome (those Germans, what savages!), but ultimately not intolerable, and that if one were just wise enough, with a bit of cunning or patience, one ought to have been able to get away with it. At the same time everyone unknowingly becomes accustomed to the horror, which little by little is accepted by morality, and will quickly become part of the mental landscape of modern man; who, the next time, will be able to be surprised or irritated at that which will in effect have ceased to be shocking?

It's here that one understands that the force of Night and Fog came less from records than from montage, from the art with which the brute, real facts (alas!) were offered to our gaze, in a restless movement that is precisely that of a lucid consciousness, somewhat impersonal, that is unable to accept or understand or admit this phenomenon. One could see more monstrous records elsewhere than those retained by Resnais; but what isn't man able to accustom himself to? Yet you cannot accustom yourself to Night and Fog; the point is that the filmmaker judges that which he shows, and is judged by the way in which he shows it.

Another thing: a phrase of Moullet's has been constantly cited, left and right, and usually foolishly enough: morality is a matter of tracking shot (or the Godard's version: tracking shots are a matter of morality); one has wanted to see in it the height of formalism, so that one could criticize its "terrorist" excess (to reclaim Paulhanien terminology). (1) Look, however, in Kapo, at the shot where Riva kills herself by throwing herself on an electric barbed-wire fence; the man who decides, at that moment, to have a dolly in to tilt up at the body, while taking care to precisely note the hand raised in the angle of its final framing -- this man deserves nothing but the most profound contempt. For several months, people have been breaking our balls over false problems of form and content, of realism and fantasy, of script and mise en scène, of the free actor or the regulated actor, and other dichotomies; let us say that it is possible that all subjects are born free and equal by law; that which counts is tone, or emphasis, nuance, as one will call it -- that is to say, the point of view of a man, the auteur, badly needed, and the attitude that this man takes in relation to that which he films, and therefore in relation to the world and to everything: that which can be expressed by a choice in situations, in the construction of the storyline, in the dialogue, in the play of actors, or in the pure and simple technique, "indifferently but as much". (2) There are things that should not be addressed except in the throes of fear and trembling; death is one of them, without a doubt; and how, at the moment of filming something so mysterious, could one not feel like an imposter? It would be better in any case to ask oneself the question, and to include the interrogation, in some way, in what is being filmed; but doubt is surely that which Pontecorvo and his ilk lack most.

To make a film is to show certain things, that is at the same time, and by the same mechanism, to show them with a certain bias; these two acts being thoroughly bound together. Just as one can't have absolute mise en scène, for there is no mise en scène in the absolute, cinema will never be a language: the relationship between sign and signifier has no recourse here, and only accomplishes the similarly sad heresies of the little Zazie. Every approach to the cinematographic act that proceeds by substituting addition in the place of synthesis, analysis in the place of unity, immediately sends us back to a rhetoric of images that has nothing more to do with the cinematographic act than industrial drawing has to do with painting; why does this rhetoric remain so dear to those who call themselves "critics of the left"? -- maybe, after all, they are primarily hardcore pedagogues; but if we have always detested, for example, Pudovkin, de Sica, Wyler, Lizzani, and the ancient combatants of IDHEC (3), it's because the logical culmination of this formalism calls itself Pontecorvo. Whatever the daily journalists think, the history of cinema isn't revolutionary every day. For a mechanic like Losey, the New York avant-garde doesn't disturb him any more than the waves on shore disturb the peace of the depths. (4) Why? It's because some people don't ask themselves anything but formal questions, while others resolve them entirely in advance and will ask none afterwards. But what do those who actually make history say instead -- those whom one also calls "men of art"? Resnais will avow that, if such a film of the week gets the audience interested in him, nevertheless he has the feeling of being nothing but an amateur before Antonioni; Truffaut would say the same, no doubt, about Renoir, Godard about Rossellini, Demy about Visconti; and as Cézanne, despite all the journalists and reviewers, was slowly imposed by the painters, so the filmmakers (les cinéastes) will impose into history Murnau or Mizoguchi...

Jacques RIVETTE.

NOTES:

1. Jean Paulhan (1884 - 1968), resistance leader and man of letters.

2. From Stéphane Mallarmé's "One Toss of the Dice Never Will Abolish Chance," the full phrasing reads, "IT WOULD BE/WORSE/no/more nor less/indifferently but as much chance." (An alternate, freer translation could be "just as well, but only as much" - Ed.)

3. L'Institut des hautes études cinématographiques -- a French film school, restructured in 1985 and now known as La Femis.

4. Rivette can be seen, sitting against a wall listening to Shirley Clarke talk in a New York City loft, in the Cinéastes de notre temps program on Clarke, "Rome brûle: Portrait de Shirley Clarke," co-directed by André S Labarthe and Noël Burch. (DS)

James Whale ou o génio esqueçido...


Para mim é aqui que desemboca toda a herança de Wiene e do seu Caligari. É aqui também que está toda a génese do posterior cinema de Tim Burton – cinema como espectáculo de monstros. No sentido que Cronenberg também lhe dá: como transformar palavras em imagens? (I Have to Make the Word Be Flesh)

Thing´s

Ce qui s’est imposé assez vite, c’était d’écrire sur Carpenter, par exemple, qui, à l’époque, a fait The Fog, un très grand film. C’était pas du tout le genre de cinéma sur lequel on écrivait aux Cahiers. Ce qui me frappait, c’était quelque chose qui commençait dans le cinéma d’épouvante et qui était l’équivalent d’une sorte de cinéma indépendant américain. C’était l’endroit où de jeunes cinéastes pouvaient faire, de façon très libre, des films pour des budgets minimes, des séries B intuitives qui pouvaient faire résistance à la machine hollywoodienne. Parmi ceux-là, outre Carpenter, il y avait Wes Craven, mais aussi David Cronenberg, trois cinéastes dont le travail m’impressionnait beaucoup et qui m’accompagnent encore aujourd’hui.

Olivier Assayas, aqui, e aqui

...

Tanto serve para dizer o tanto que amo estes filmes, como para reiterar completamente o que escrevi por alturas do Fantasporto.
Boarding Gate é filmaço!

"Mystic River", Clint Eastwood, 2003

aquele gesto...

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Fear City - realidades



Descontando as obras absolutas de 90 e 92 (mesmo assim…) é porventura em Fear City, 1984, que a vertente da ”realidade” do cinema de Ferrara atinge um cume. Por dois lados: o lado da velha tradição Baziniana – Abel acredita na realidade (a maneira suja, feia e sem enfeites com que filma a sua cidade), neo-realismo é mesma a palavra certa para este lado.
Mas depois há uma pulsão destruidora, que no seu cinema se poderá iconizar na personagem de Keitel em Bad Lieutenant – meios e corpos captados com impulsos, com raiva, com fúria e sangue…
Ferrara é o cineasta da crueldade do presente.

Bigger than Life


Nada contra isto, mas quando leio esse titulo em qualquer post, não penso em mais nada que a monumental obra de Ray. Not Scott, never...
(e já agora aproveito e meto um dos meus texto favoritos de sempre)

Ford total




“Não sendo um western ou um filme de guerra, é muitas vezes olhado como um objecto "atípico" ou "secundário" na trajectória de John Ford: The Last Hurrah/O Último Hurrah”.

...

Pensava que este mito, o do John Ford só fazer Westerns e filmes de guerra (?) já se tinha desvanecido. Enfim, é o João Lopes que o emerge novamente, ainda por cima com uma grande Obra-Prima sobre um homem que já nada teme e sobre…o espectáculo demagógico e patético do poder televisivo.

E o que são filmes como: The Grapes of Wrath; How Green Was My Valley?; Tobacco Road; The Quiet Man; The Sun Shines Bright; Donovan's Reef; etc…isto só para citar os meus favoritos – filmes de guerra? Westerns?
Cada vez fico mais convencido que os culpados destes mitos são a própria (uma certa) critica.

puta foda, é mesmo isto!

Por causa de Little Odessa e, sobretudo, de The Yards, e ainda por causa de tudo o que tinha lido sobre ele (os comentários positivos mas sobretudo os comentários negativos), andava um bocado em pulgas para ver We Own the Night, coisa que só hoje tive ocasião de fazer. É um filme espantoso, crescentemente espantoso, nos seus aspectos interiores (o que é balbuciado, elidido, não mencionado - como as sombras azul-polícia que tomam conta da fotografia na segunda parte) muito mais do que por quaisquer "saliências" (o pessoal hoje grama é "virtuosismo", coisa para que Gray, felizmente, se está nas tintas). E qual Coppola, qual Scorsese: quando chega o último plano, os "I love you very much" sussurrados pelos dois irmãos Grusinsky, lado a lado, torna-se evidente que se Gray tem os olhos em alguém é em Ford. Troquem as fardas da polícia por umas fardas da Cavalaria e não têm como discordar.

ufff...estava a ver que aqui na tuga ninguém entendia, obrigado!
Reforço o que sempre disse: não é Coppola, não é Scorsese, não é anos 70...eu até ia mais para Hawks, mas o Luis Miguel Oliveira acertou perfeitamente.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Argento

O primeiro plano como programa/lançamento do todo filmico. Como os cigarros a queimarem em The Big Sleep de Hawks. No principio como no final. Desejo/medo/pulsão/culpa, talvez…por aqui sim, Argento aproxima-se de mestre Hitchcok, até no leitmotif. Enfim, a obra sublime do Giallo.

Profondo Rosso, Dário Argento, 1975

ahhh...Zurlini

Cada vez mais incomodado, como foi possível ignorar Valerio Zurlini, ainda hoje tão pouco discutido e mostrado, na evolução do cinema moderno?
Em Cronaca familiare, de 1962, todas as nuances e interposições/sobreposições de lembranças e fugas estão prodigiosamente inseridas num centro que engloba passado, presente e futuro. A saída é irremediável e Zurlini está a um nível perfeitamente igual ao que, por exemplo, Deleuze descreve no segundo tomo (Imagem-tempo) dos seus escritos sobre cinema, acerca da imagem lembrança. Com a vantagem preciosa de dispensar qualquer flashback.
Tudo a uma luz tão envolvente que não mais faz do que trabalhar a falta de linearidade de qualquer memória, a inserção nas sombras, um efeito novelo…

o mais justo/belo texto já escrito

El travelling de Kapo, Serge Daney

Entre las películas que nunca vi no solamente están Octubre, Amanece o Bambi, sino también la oscura Kapo, un film sobre los campos de concentración rodado en 1960 por el italiano Gillo Pontecorvo. Kapo no hizo historia en la historiadel cine. ¿Seré yo el único que, sin haberla visto, no la olvidará jamás? En realidad no vi Kapo y al mismo tiempo sí lavi, porque alguien -con palabras- me la mostró. Esta película cuyo título, como una palabra clave, acompañó mi vida cinéfila, solo la conozco a través de un breve texto: la crítica que hizo Jacques Rivette en junio de 1961 en Cahiers ducinéma. Era el número 120, y el artículo se llamaba "De la abyección". Rivette tenía treinta y tres años, yo diecisiete.Seguramente no había pronunciado nunca antes en mi vida la palabra "abyección".

En su artículo Rivette no cuenta la película sino que se contenta con describir un plano en una sola frase. La frase, quese grabó en mi memoria, decía así: "Observen, en Kapo, el plano en que Riva se suicida tirándose sobre los alambres depúa electrificados: el hombre que en ese momento decide hacer un travelling hacia adelante para reencuadrar elcadáver en contrapicado, teniendo el cuidado de inscribir exactamente la mano levantada en un ángulo del encuadre final, ese hombre merece el más profundo desprecio". Así, un simple movimiento de cámara podía ser el movimiento que no había que hacer. Para atreverse a hacerlo -naturalmente- había que ser abyecto. Apenas terminé de leer estas líneas supe que su autor tenía toda la razón.

Abrupto y luminoso, el texto de Rivette me permitía definir con palabras el rostro de la abyección. Mi rebeldía habíaencontrado su expresión. Pero, además, esa rebeldía estaba acompañada de un sentimiento más oscuro y sin dudamenos puro: la serena revelación de haber adquirido mi primera certeza como futuro crítico. Durante esos años,efectivamente, "el travelling de Kapo" fue mi dogma portátil, el axioma que no se discutía, el punto límite de todo debate. Con cualquiera que no sintiera de inmediato la abyección del "travelling de Kapo" yo no tenía definitivamente nada que ver, nada que compartir.

Además, ese tipo de rechazo estaba de moda en esa época. Por el estilo rabioso y excesivo del artículo de Rivette,imaginaba que ya se habían producido debates terribles, y me parecía lógico que el cine fuera la caja de resonancia privilegiada de toda polémica. La guerra de Argelia se terminaba y por el hecho de no haber sido filmada volvía de antemano sospechosa cualquier tentativa de representación de esa Historia. Todo el mundo parecía entender que podía haber -incluso y sobre todo en el cine- figuras tabú, indulgencias criminales y montajes prohibidos. La célebre fórmulade Godard que ve en los travellings "una cuestión de moral" me parecía una de esas verdades evidentes sobre las cuales no se retractaría nadie. Yo no, en todo caso.

El artículo fue publicado en Cahiers du cinéma tres años antes de que terminara su período amarillo. ¿Acaso sentí queno podía haberse publicado en ninguna otra revista de cine, que ese texto pertenecía al pasivo de los Cahiers como yo, más tarde, les pertenecería? En cualquier caso, encontré mi familia, yo, que tenía tan poca. No era solo por mimetismo snob que compraba los Cahiers desde hacía dos años y compartía embelesado sus comentarios con un compañero -Claude D.- del liceo Voltaire. No por mero capricho, a principios de cada mes, pegaba la nariz contra la vidriera de una modesta librería de la Avenue de la République. Bastaba con que, bajo la banda amarilla, la foto en blanco y negro de laportada hubiera cambiado para que el corazón me diera un vuelco. Pero no quería que fuera el librero quien me dijera sila revista había salido o no. Quería descubrirlo por mí mismo y pedirla fríamente, con voz neutra, como si se tratara de un cuaderno de borrador. En cuanto a la idea de suscribirme, jamás se me pasó por la cabeza: me gustaba sentir esa impaciencia exasperada. Fuera para comprarlos, luego para escribir en ellos y finalmente para fabricarlos, no me molestaba quedarme en el umbral de los Cahiers porque, de todas maneras, los Cahiers eran "mi hogar".

En el liceo Voltaire un puñado de compañeros entramos subrepticiamente en la cinefilia. Puedo dar la fecha: 1959. La palabra "cinéfilo" era todavía un término feliz, pero ya tenía esa connotación enfermiza y ese aura rancia que poco a poco la desacreditarían. En cuanto a mí, menosprecié de entrada a aquellos que, demasiado normalmente constituidos, se burlaban de las "ratas de cinemateca" en que nos convertiríamos durante algunos años, culpables de vivir el cine como una pasión y la vida por procuración. A principios de los sesenta, el mundo del cine era aún un espacio maravilloso. Por un lado, poseía todos los encantos de una contracultura paralela. Por el otro, tenía la ventaja de estar ya constituido, con una sólida historia, con valores reconocidos (las preferencias de Sadoul, esa Biblia insuficiente), con su demagogia y sus mitos recalcitrantes, con sus batallas ideológicas y sus revistas en guerra. Las guerras prácticamente habían terminado y nosotros llegábamos un poco tarde, es cierto; pero no tanto como para no acariciar el sueño de apropiarnos de toda esa historia que todavía no tenía la edad del siglo.

Ser cinéfilo era simplemente engullir, paralelamente al del colegio, otro programa escolar con los Cahiers amarillos como línea rectora y algunos "guías" adultos que, con la discreción de los conspiradores, nos indicaban que allí había un mundo por descubrir y que podía tratarse nada menos que del mundo donde valía la pena vivir. Henri Agel (profesor de letras del liceo Voltaire) fue uno de esos guías singulares. Para evitarnos a nosotros y a él la pesadez de las clases de latín, sometía a elección mayoritaria la alternativa siguiente: dedicar la hora a un texto de Tito Livio o ver películas. La clase, que votaba por las películas, salía cautivada y pensativa del vetusto cineclub. Por sadismo y sin duda porque poseía las copias, Agel proyectaba películas apropiadas para "avivar" a los adolescentes. Films como La sangre de lasbestias de Franju y, sobre todo, Noche y niebla de Resnais. Gracias al cine supe que la condición humana y la carnicería industrial no eran incompatibles, y que lo peor acababa de ocurrir.

Hoy me imagino que a Agel (para quien el Mal se escribía con mayúsculas) le gustaba atisbar sobre las caras de los adolescentes de la clase de quinto B los efectos de esta singular revelación. Había algo de voyeurismo en esa manera brutal de transmitir, por medio del cine, ese saber macabro e inevitable del cual éramos la primera generación heredera. Cristiano pero no proselitista, militante antes que elitista, Agel también mostraba, a su manera. Tenía ese talento. Mostraba porque había que hacerlo. Y porque la cultura cinematográfica en el colegio, por la cual militaba, pasaba también por esa selección silenciosa entre los que nunca olvidarían Noche y niebla y los demás. Yo no formaba parte de"los demás".

Una vez, dos veces, tres veces, según los caprichos de Agel y las clases de latín sacrificadas, miraba yo las famosas pilas de cadáveres, las cabelleras, los anteojos y los dientes. Escuché el comentario desolado de Jean Cayrol en lavoz de Michel Bouquet y la música de Hans Eisler que parecía excusarse de existir. Extraño bautismo de imágenes: comprender al mismo tiempo que los campos de concentración eran verdad y que la película era justa. Y que el cine -¿y solo él?- era capaz de instalarse en los límites de una humanidad desnaturalizada. Sentí que las distancias establecidas por Resnais entre el sujeto filmado, el sujeto filmante y el sujeto espectador eran, tanto en 1959 como en 1955, las únicas distancias posibles. Noche y niebla, ¿una película "bella"? No, una película "justa". Era Kapo la que quería ser una película bella y no podía. Y yo nunca estableceré muy bien la diferencia entre lo bello y lo justo. De ahí el aburrimiento, ni siquiera "distinguido", que me producen las bellas imágenes.

Capturado por el cine, no tuve necesidad de ser seducido. Ni de que me hablaran como a un chico. De niño, no vi ninguna película de Walt Disney. Así como fui enviado directamente a la escuela primaria, estaba orgulloso de haberme ahorrado el bullicioso jardín de infantes de las proyecciones infantiles. Peor: los dibujos animados siempre serían para mí algo distinto del cine. Peor aun: los dibujos animados serían siempre un poco el enemigo. Ninguna "imagen bella", diseñada a fortiori, compensaba la emoción -el miedo y el temblor- frente a las cosas registradas. Y todo eso que es tansencillo pero que necesité tantos años para formular simplemente, empezó a salir del limbo ante las imágenes deResnais y el texto de Rivette. Nacido en 1944, dos días antes del desembarco aliado en Normandía, tenía edad para descubrir al mismo tiempo mi cine y mi historia. Menuda historia que durante mucho tiempo creí compartir con otros antes de entender -muy tarde- que era efectivamente la mía.

¿Qué sabe un niño? ¿Y ese pequeño Serge Daney que quería saber todo excepto lo que le concernía directamente?¿Sobre qué trasfondo de ausencia en el mundo será requerida más tarde la presencia de las imágenes del mundo? Conozco pocas expresiones tan bellas como la de Jean-Louis Schefer cuando, en su libro L'homme ordinaire du cinéma, habla de las "películas que miraron nuestra infancia". Porque una cosa es aprender a ver películas "como un profesional" -para verificar por otro lado que son ellas las que nos miran cada vez menos- y otra cosa es vivir con las películas que nos vieron crecer y que nos miraron, rehenes precoces de nuestra biografía futura, atrapados en las redesde nuestra historia. Psicosis, La dolce vita, La tumba hindú, Río Bravo, El carterista, Anatomía de un asesinato, L'héros sacrilège [Mizoguchi] o, precisamente, Noche y niebla no son películas como las otras para mí.

Los cuerpos de Noche y niebla y, dos años más tarde, los de los primeros planos de Hiroshima mon amour son de"esas cosas" que me miraron más de lo que yo las vi. Eisenstein intentó crear ese tipo de imágenes pero fue Hitchcock quien lo consiguió. ¿Cómo olvidar -no es más que un ejemplo- nuestro primer encuentro con Psicosis? Entramos fraudulentamente al Paramount Opéra y, como es natural, la película nos aterrorizó. Hacia el final, hay una escena sobrela que mi percepción resbala, un montaje fragmentado del cual solo emergen accesorios grotescos: un salto de cama cubista, una peluca que se cae, un cuchillo blandido a punto de atacar. Al terror vivido en compañía le sigue la calma de una soledad resignada: el cerebro funciona como un segundo aparato de proyección que aislará la imagen, dejando a la película y al mundo seguir sin ella. No me imagino un amor por el cine que no se apoye sobre el presente robado de ese"siga usted sin mí".

¿Quién no ha vivido ese estado? ¿Quién no ha conocido esos recuerdos-pantallas? Imágenes no identificadas se inscriben en la retina, eventos desconocidos ocurren fatalmente, palabras proferidas se vuelven la cifra secreta de un saber imposible sobre uno mismo. Esos momentos "no vistos-no capturados" son la escena primitiva del cinéfilo, aquella de la cual estaba ausente aunque solo a él le concernía. En el sentido en que Paulhan habla de la literatura como de una experiencia del mundo "cuando no estamos ahí" y Lacan habla de "lo que falta en su sitio". ¿El cinéfilo? Es aquel que abre desmesuradamente los ojos pero que no se atrevería nunca a decirle a nadie que no pudo ver nada. Aquel que se forja una vida de "mirador" profesional, a fin de recuperar su retraso, de rehacerse y de hacerse. Lo más lentamente posible.

Así fue como mi vida tuvo su punto cero, un segundo nacimiento vivido como tal e inmediatamente conmemorado. La fecha es conocida, sigue siendo el año 1959. Es -¿coincidencia?- el año de la célebre frase de Duras: "No has visto nada en Hiroshima". Mi madre y yo salimos alucinados de ver Hiroshima mon amour -y no éramos los únicos- porque nunca pensamos que el cine fuera capaz de "eso". Y en el andén del subterráneo me doy cuenta de que esa pregunta odiosa que nunca había sabido contestar ("¿Qué vas a hacer de tu vida?") por fin tiene respuesta. Más tarde, de una forma u otra, será el cine. Jamás fui avaro en detalles sobre este "cine-nacimiento" en mí mismo. Hiroshima, el andén del subterráneo, mi madre, la antigua sala de los Agricultores y sus sillones de club serán evocados más de una vez como el decorado legendario del verdadero origen, aquel que uno eligió para sí.

Resnais, lo veo muy claro, es el nombre que une esta escena primitiva en dos años y tres actos. Puesto que Noche y niebla fue posible, Kapo nació perimida y Rivette pudo escribir su artículo. Sin embargo, antes de ser el prototipo del cineasta "moderno", Resnais fue para mí un guía más. Si revolucionó, como decíamos por aquel entonces, el "lenguaje cinematográfico", fue porque se tomó en serio su tema y porque tuvo la intuición, casi la suerte, de reconocerlo en mediode todos los demás: nada menos que la especie humana tal como salió de los campos de concentración nazis y del trauma atómico. Arruinada y desfigurada. También hubo algo raro en la manera como me volví un espectador algo aburrido de las otras películas de Resnais. Me parecía que sus intentos de revitalizar un mundo, del cual solo él había registrado a tiempo la enfermedad, estaban destinados a no producir sino malestar.

Por lo tanto, no es con Resnais con quien haré el viaje del cine "moderno" y su devenir, sino más bien con Rossellini. No es con Resnais con quien aprenderé lecciones sobre las cosas y sobre moral, sino con Godard. ¿Por qué? Primero, porque Godard y Rossellini hablaron, escribieron y reflexionaron en voz alta. Y la imagen de Resnais plantado como la Estatua del Comendador, aterido en su chaqueta y pidiendo -con derecho pero en vano- que le crean cuando declaró noser un intelectual, terminó por ofuscarme. ¿Fue acaso una forma de "vengarme" del hecho de que dos de sus películas hubieran "levantado el telón de mi vida"? Resnais fue el cineasta que me sacó de la infancia o, mejor dicho, que hizo de mí un niño serio por más de tres décadas. Pero, de adulto, no volvería a compartir nada con él. Recuerdo que al final de una entrevista -cuando estrenaba La vida es una novela- tuve ganas de hablarle del impacto que Hiroshima mon amour había producido en mi vida, lo cual me agradeció con un aire seco y distante, como si hubiera elogiado su nuevo impermeable. Me ofendí, pero estaba equivocado: las películas "que miraron nuestra infancia" no se pueden compartir, ni siquiera con su autor.

Ahora que esta historia se acabó y que tuve más que mi parte de la "nada" que había para ver en Hiroshima, me planteo fatalmente la pregunta: ¿podía haber sido de otra manera? ¿Podía haber, frente a los campos de concentración, otra actitud "justa" posible que la del antiespectáculo de Noche y niebla? Una amiga mía recordaba hace poco el documentalde George Stevens, realizado al final de la guerra, enterrado, exhumado y exhibido recientemente en la televisión francesa. La primera película que registró la apertura de los campos de concentración en colores y a la que esos mismos colores llevan -sin ninguna abyección- al arte. ¿Por qué? ¿La diferencia entre el color y el blanco y negro? ¿Entre Europa y América? ¿Entre Stevens y Resnais? Lo maravilloso de la película de Stevens es que se trata de un relato de viaje: la progresión cotidiana de un pequeño grupo de soldados que filman y de cineastas que vagabundean a través de una Europa arrasada, desde Saint-Malô en ruinas hasta Auschwitz, que nadie había previsto y que conmociona al equipo de rodaje. Mi amiga me decía que las pilas de cadáveres poseen una belleza extraña que hace pensar en la gran pinturade este siglo. Como siempre, Sylvie Pierre tenía razón.

Ahora entiendo que la belleza del documental de Stevens depende menos de la distancia justa con la que filmó que de la inocencia con que miró todo aquello. La distancia justa es el fardo que debe cargar el que viene "después"; la inocencia es la gracia terrible otorgada al primero que llega, al primero que ejecuta, simplemente, los gestos del cine. Solo amediados de los años 70 pude reconocer en el Salô de Pasolini, o incluso en el Hitler de Syberberg, el otro sentido de la palabra "inocente": no tanto el no culpable sino aquel que, filmando el Mal, no piensa mal. En 1959 y recién endurecido por su descubrimiento, yo ya compartía la culpabilidad de todos. Pero en 1945 bastaba tal vez con ser americano y asistir, como George Stevens o el cabo Samuel Fuller en Falkenau, a la apertura de las verdaderas puertas de la noche con una cámara en las manos. Había que ser americano (es decir, creer en la inocencia fundamental del espectáculo)para obligar a la población alemana a desfilar ante las tumbas abiertas y mostrarles junto a qué habían vivido. Sucedió diezaños antes de que Resnais se sentara a su mesa de edición y quince años antes de que Pontecorvo agregara ese pequeño movimiento que nos indignó a Rivette y a mí. La necrofilia era el precio de ese "retraso" y el reverso erótico de la mirada "justa", el de la Europa culpable, el de Resnais y, en consecuencia, el mío.

Así empezó mi historia. El espacio abierto por la frase de Rivette era perfectamente el mío, como ya era mía la familia intelectual de Cahiers du cinéma. Pero ese espacio era más una puerta estrecha que un campo vasto y abierto. Con ese goce, por el lado noble, de la distancia justa y su reverso de necrofilia sublime o sublimada. Y, por el lado innoble, la posibilidad de un goce totalmente diferente e insublimable. Fue Godard quien, mostrándome unos cassettes de "pornografía concentracionaria" guardados en un rincón de su videoteca de Rolle, se asombró un día de que nunca se hubiera elaborado una crítica ni se hubiera formulado una prohibición contra esas películas. Como si la bajeza de las intenciones de sus realizadores y la trivialidad de los fantasmas de sus consumidores las "protegieran", de algún modo, contra la censura y la indignación. Esto prueba que en la subcultura perduraban las sordas reivindicaciones de una complicidad obligatoria entre los verdugos y las víctimas. La existencia de esas películas nunca me había preocupado. Tenía hacia ellas (como hacia todo cine abiertamente pornográfico) la tolerancia casi cortés con que se acepta la expresión de la obsesión cuando es tan cruda que solo puede reivindicar la triste monotonía de su necesaria repetición.

Es la otra pornografía (la "artística" de Kapo, como más tarde la de Portero de noche y otros productos "retro" de los años 70) la que siempre me indignó. A la estetización consensual a posteriori, prefería el retorno obstinado a las noimágenes de Noche y niebla, e incluso el derrame pulsional de cualquier Loba entre los SS que nunca vería. Esas películas tenían por lo menos la honestidad de tomar en cuenta una misma imposibilidad de contar, un alto en lacontinuidad de la Historia, cuando el relato se cristaliza o se desboca en el vacío. En ese sentido, no habría que hablar de amnesia o de represión sino de forclusión. Palabra cuya definición lacaniana entendería más tarde: retorno alucinatorio a una realidad sobre la cual no fue posible establecer un "juicio de realidad". Dicho de otra manera: puesto que los cineastas no filmaron a su debido tiempo la política de Vichy, su deber, cincuenta años después, no consiste en enmendarse imaginariamente con películas como Adiós a los niños, sino en retratar actualmente a esa buena gente francesa que, de 1940 a 1942, Velódromo de Invierno incluido, ni se inmutó. Siendo el cine un arte del presente, sus remordimientos carecen totalmente de interés.

Por eso, el espectador que fui de Noche y niebla y el cineasta que con esa película intentó mostrar lo irrepresentable estábamos unidos por una simetría cómplice. O bien es el espectador quien súbitamente "falta en su sitio" y se detiene mientras la película sigue, o bien es la película la que en lugar de "continuar" se repliega sobre sí misma y sobre una imagen provisoriamente definitiva, que permite al sujeto-espectador seguir creyendo en el cine y al ciudadano vivir suvida. Un alto en el espectador, un alto en la imagen: el cine ha entrado en su edad adulta. La esfera de lo visible dejó de estar totalmente disponible: hay ausencias y huecos, cavidades necesarias y llenos superfluos, imágenes que faltarán siempre y miradas para siempre insuficientes. Espectáculo y espectador asumen sus responsabilidades. Es así que, habiendo escogido el cine, ese famoso "arte de la imagen en movimiento", empecé mi vida de "cinéfago" bajo el signo paradójico de una primera imagen detenida.

Ese alto me protegió de la necrofilia estricta y no vi ninguna de las películas raras o documentales "sobre los campos de concentración" que siguieron a Kapo. Para mí el asunto había concluido con Noche y niebla y el artículo de Rivette. Durante mucho tiempo fui como el gobierno francés, que ante cualquier incidente antisemita difundía precipitadamente la película de Resnais, como si formara parte de un arsenal secreto que podía oponer indefinidamente sus virtudes de exorcismo a la recurrencia del Mal. Pero si yo no aplicaba el axioma del "travelling de Kapo" a las películas cuyo tema las exponía a la abyección, es porque intentaba aplicárselo a todos los films. "Hay cosas -había escrito Rivette- que deben ser abordadas en el miedo y en el temblor; la muerte sin duda es una de ellas; ¿cómo filmar algo tan misterioso sin sentirse un impostor?" Yo estaba de acuerdo. Y como son raras las películas en las que no muere alguien, había muchas ocasiones de tener miedo y de temblar. Ciertos cineastas, efectivamente, no eran impostores. Es así como, siempre en1959, la muerte de Miyagi en Cuentos de la luna pálida me clavó, desgarrado, a mi butaca del teatro Bertrand. Porque Mizoguchi había filmado la muerte como una fatalidad vaga, de la cual se veía claramente que podía y no podía producirse. Recuerdo la escena: en la campiña japonesa unos bandidos hambrientos atacan a unos viajeros y uno delos bandidos atraviesa a Miyagi con su lanza. Pero lo hace casi inadvertidamente, titubeando, movido por un resto de violencia o por un reflejo estúpido. Este evento posa tan poco para la cámara que esta estuvo a punto de no verlo, yestoy persuadido de que a todo espectador de Cuentos de la luna pálida se le ocurrió la misma idea loca y casi supersticiosa: si el movimiento de cámara no hubiera sido tan lento, la acción se habría producido fuera de cuadro o -¿quién sabe?- simplemente no se habría producido.

¿Culpa de la cámara? Disociándola de las gesticulaciones de los actores, Mizoguchi procede exactamente a la inversa de Kapo. En lugar de una mirada decorativa, Mizoguchi lanza una ojeada que "hace como si no viera", una mirada que preferiría no haber visto nada, y de esa manera muestra el acontecimiento tal como se produce, ineluctablemente y al sesgo. Un hecho absurdo como todo incidente que se convierte en tragedia y carente de sentido, como la guerra, una calamidad que a Mizoguchi nunca le gustó. Un acontecimiento que no nos afecta lo suficiente como para que uno siga su camino avergonzado. Estoy seguro de que en este preciso instante cualquier espectador de los Cuentos sabe absolutamente lo que es el absurdo de la guerra. No importa que el espectador sea occidental, la película japonesa y la guerra medieval: basta pasar del acto de señalar con el dedo al arte de señalar con la mirada para que ese saber, tan furtivo como universal, el único del cual el cine es capaz, nos sea otorgado.

Al optar tan temprano por la panorámica de Cuentos contra el travelling de Kapo, escogí algo cuya gravedad no comprendí sino diez años después, al calor, tan radical como tardío, de la politización post 68 de los Cahiers. Ahora bien, si Pontecorvo, futuro director de La batalla de Argelia, es un cineasta valiente cuyas opiniones políticas comparto en general, Mizoguchi solo vivió para su arte y parece haber sido, políticamente hablando, un oportunista. ¿Donde está la diferencia? Justamente en "el miedo y el temblor". Mizoguchi le tiene miedo a la guerra porque, a diferencia de su hermano menor Kurosawa, los hombrecitos cortándose mutuamente las carótidas contra un fondo de virilidad feudal lo espantan. De ese miedo, de esas ganas de vomitar y de huir proviene aquella panorámica sorprendente. Es ese miedoel que hace que ese sea un momento justo, es decir, un momento que se puede compartir. En cuanto a Pontecorvo, no tiembla ni tiene miedo; los campos de concentración solo lo indignan ideológicamente. Por eso se inscribe "al margen" dela escena, bajo los auspicios proxenetas de un bonito travelling.

El cine - me daba cuenta- oscilaba muy frecuentemente entre esos dos polos. Incluso en el caso de cineastas más consistentes que Pontecorvo, choqué más de una vez contra esa manera contrabandista -la práctica "mosquita muerta" y generalizada del guiño- de sobrecargar con bellezas parásitas o con informaciones cómplices una escena que no necesitaba más. Como la ráfaga de viento que empuja el paracaídas blanco que cubre como un sudario elcuerpo del soldado muerto en Los invasores de Fuller y que me incomodó durante años. Menos, sin embargo, que la pollera levantada de Anna Magnani, víctima de otra ráfaga (de ametralladora) en uno de los episodios de Roma, ciudad abierta. Rossellini también daba "golpes bajos" pero lo hacía de una forma tan novedosa que se necesitaron años para comprender hacia qué abismos nos llevaba. ¿Dónde termina el acontecimiento? ¿Dónde está la crueldad? ¿Dónde empieza la obscenidad y dónde termina la pornografía? Sabía que estas eran las cuestiones, obsesivas, inherentes al cine de "después de los campos de concentración". Cine que yo bauticé, para mí solo y porque tenía mi edad, "cine moderno".

Ese cine moderno tenía una característica: era cruel. Y nosotros teníamos otra: aceptábamos esa crueldad. La crueldad era el "lado bueno". Era ella la que decía no a la ilustración académica y denunciaba el sentimentalismo hipócrita de un humanismo por aquel entonces muy charlatán. La crueldad de Mizoguchi, por ejemplo, consistía en montar al mismo tiempo dos movimientos irreconciliables y en producir un sentimiento desgarrador de "falta de auxilio a persona en peligro". Sentimiento moderno por excelencia, que precedió en tan solo quince años a los grandes travellings impasibles de Week-end. Sentimiento arcaico también ya que esa crueldad era tan vieja como el cine mismo, el índice de lo que era fundamentalmente moderno en él, desde el último plano de Luces de la ciudad de Chaplin hasta El desconocido de Browning, pasando por el final de Nana.

¿Cómo olvidar aquel lento y tembloroso travelling que lanza el joven Renoir frente a Nana en su lecho, sifilítica y agonizante? ¿Cómo hicieron (nos rebelábamos las ratas de cinemateca en que nos habíamos convertido) para ver en Renoir un poeta de la vida beata cuando en realidad era uno de los raros cineastas capaces de liquidar a un personaje a golpes de travelling?

De hecho, la crueldad entraba en la lógica de mi itinerario de combatiente de los Cahiers. André Bazin, que ya había escrito la teoría de esa crueldad, la encontró tan estrechamente ligada a la esencia misma del cine que la convirtió en "sucosa". A Bazin, aquel santo laico, le encantaba Historia de Louisiana de Flaherty porque se veía un cocodrilo comerse un ájaro en tiempo real y en un solo plano: demostración cinematográfica y montaje prohibido. Escoger los Cahiers era elegir el realismo y, como descubrí más tarde, un cierto desprecio por la imaginación. Al "¿Quieres ver? Toma, mira esto"de Lacan, respondía por adelantado un "¿Eso fue filmado? ¡ Entonces hay que verlo!". Incluso y sobre todo cuando "eso"resultaba desagradable, intolerable o decididamente invisible.

Ese realismo tenía dos caras. Si era a través de él como los modernos mostraban un mundo sobreviviente, fue a través de un realismo completamente diferente (más bien una "realística") como las propagandas filmadas de los años 40 habían colaborado con la mentira y prefigurado la muerte (el cine francés, cómplice durante la ocupación alemana). Es por eso que resultaba justo, a pesar de todo, llamar al primero de los dos, nacido en Italia, "neorrealismo". Es imposible amar "el arte del siglo" sin ver ese arte trabajando para la locura del siglo y trabajado por ella. A diferencia del teatro(crisis y cura colectivas), el cine (información y luto personales) estaba íntimamente comprometido con el horror del cual apenas se levantaba. Yo heredé un convalesciente culpable, un niño envejecido, una hipótesis sostenida. Envejeceríamos juntos, pero no eternamente.

Heredero consciente, cinéfilo e hijo modelo del cine, con "el travelling de Kapo" como amuleto protector, veía pasar los años con una sorda aprensión: ¿y si el amuleto perdiera su eficacia? Recuerdo cuando, a cargo de un curso muy numeroso como profesor en la Universidad de Censier-París, fotocopié el texto de Rivette y lo distribuí entre mis alumnos para que lo leyeran y dieran su opinión. Todavía estábamos en la época "roja" durante la cual algunos alumnos intentaban recuperar a través de sus profesores migajas de la radicalidad política del 68. Me parece que, por respeto amí, los más motivados consintieron en ver "De la abyección" como un documento histórico interesante pero pasado de moda. No fui rígido con ellos ni les guardé rencor. Si por casualidad repitiera la experiencia con estudiantes de ahora, nome preocuparía por saber si lo que les perturba es el travelling, sino más bien por saber si existe para ellos algún índice de abyección. Para ser franco, mucho me temo que no lo haya. Esto es señal no solo de que los travellings ya no tienen nada que ver con la moral sino de que el cine está demasiado débil para albergar semejante problemática.

Lo que pasa es que treinta años después de las reiteradas proyecciones de Noche y niebla en el liceo Voltaire, los campos de concentración (que me sirvieron de escena primitiva) dejaron de estar fijados en el respeto sagrado donde los mantenían Resnais, Cayrol y algunos otros. Abandonada a los historiadores y a los curiosos, de ahora en adelante la cuestión de los campos de concentración forma parte de sus trabajos, de sus divergencias, de sus locuras. El deseo "forcluso" que vuelve de manera "alucinatoria a la realidad" es evidentemente aquel que nunca debió volver: el deseo de que no hubieran existido cámaras de gas, ni la solución final ni, in extremis, campos de concentración: revisionismo, faurisonismo, negacionismo, siniestros y últimos "ismos". No es solamente el travelling de Kapo lo que hereda hoy un estudiante de cine, sino una transmisión defectuosa, un tabú mal elevado; en otras palabras, una nueva vuelta de tuerca en la historia estúpida de la tribalización de lo "mismo" y la fobia a lo "otro". Aquel alto en la imagen dejó de operar; la banalidad del mal puede animar nuevos altos, esta vez electrónicos.

En la Francia actual se advierten suficientes síntomas para que, retornando sobre lo que vivimos como Historia, alguiende mi generación tome conciencia del paisaje en el que creció. Paisaje trágico y al mismo tiempo confortable. Dos sueños políticos - el americano y el comunista- trazados por Yalta. A nuestra espalda: un punto de no retorno moral simbolizado por Auschwitz y el concepto nuevo de "crimen contra la humanidad". Frente a nosotros: el impensable y casi tranquilizador apocalipsis atómico. Todo esto, que acaba de terminar, duró más de cuarenta años. Yo formo parte dela primera generación para la que el racismo y el antisemitismo habían sido definitivamente arrojados al "basurero de la Historia". La primera, ¿y la única? La única al menos que no se alarmó fácilmente frente al lobo del fascismo -"¡ Nopasarán! ¡Los fascistas no pasarán!"- simplemente porque parecía cosa del pasado, sin sentido y de una vez por todas acabada. Error, obviamente. Error que no impidió vivir bien esos "gloriosos treinta años" de abundancia, aunque entre comillas. Ingenuidad, por supuesto, y también creencia ingenua en que, en el campo estético, la necrofilia elegante deResnais mantendría eternamente "a distancia" toda intrusión no delicada.

"No puede haber poesía después de Auschwitz", declaraba Adorno; más tarde se retractó de su célebre frase. "No puede haber ficción después de Resnais", pude haber dicho yo como un eco, antes de abandonar esa idea un poco excesiva. Protegidos por la onda de choque producida por el descubrimiento de los campos de concentración, ¿ creímos que la humanidad había caído (una sola vez pero nunca más) en lo inhumano? ¿Apostamos realmente que, por una vez, "lo peor quedaba a buen recaudo"? ¿Esperamos hasta ese punto que lo que aún no llamábamos la Shoah fuese el acontecimiento único "gracias" al cual la humanidad entera "salía" de la Historia para sobrevolarla un instante y reconocer en ella, evitable, el peor rostro de su posible destino? Parece que sí.

Pero si "único" y "entera" estaban de más y si la humanidad no heredaba la Shoah como la metáfora de aquello de loque fue y es capaz, la exterminación de los judíos quedará como una historia de judíos, luego -por orden decreciente de culpabilidad, por metonimia- una historia muy alemana, bastante francesa, árabe únicamente de rebote, muy poco danesa y casi nada búlgara. Es a la posibilidad de la metáfora a lo que respondía, en el cine, el imperativo "moderno"de pronunciar el alto en la imagen y el embargo de la ficción. Para aprender a contar de manera distinta otra historia en la cual "el género humano" sería el único personaje y la primera antiestrella. Para dar a luz otro cine, un cine que "sabría"que convertir demasiado pronto el acontecimiento en ficción implica quitarle su unicidad, porque la ficción es esa libertad que desmigaja y que se abre, de antemano, a las variantes infinitas y a la seducción del mentir-verdadero.

En 1989, mientras trabajaba para el diario Libération en Phnom-Phen y en el campo camboyano, vislumbré cómo es un genocidio (e incluso un autogenocidio) que no deja detrás de sí ninguna imagen y casi ninguna huella. La prueba de que el cine ya no estaba íntimamente ligado a la historia de los hombres, ni siquiera en su vertiente inhumana, la constataba yo, irónicamente, en el hecho de que -a diferencia de los verdugos nazis que habían filmado a sus víctimas- loskhmers rojos solo habían dejado fotos y osarios. Ahora bien, dado que otro genocidio, el camboyano, se había quedado ala vez sin imágenes y sin castigo, la Shoah misma entraba en el reino de lo relativo por un efecto de contagio retroactivo. Retorno de la metáfora bloqueada a la metonimia activa; de la imagen detenida a la viralidad analógica.Todo ocurrió muy de prisa: desde 1990, la revolución rumana acusaba a asesinos indiscutibles bajo cargos tan frívolos como portación ilegal de armas de fuego y genocidio. ¿Había que volver a empezar todo desde el principio? Sí, todo. Pero esta vez sin el cine. De allí mi duelo.

Porque creímos, indudablemente, en el cine. Es decir, hicimos todo lo posible para no creer en él. Esa es toda la historiade los Cahiers du cinéma post-68 y de su imposible rechazo del bazinismo. Por supuesto que no se trataba de"dormirse en los laureles" ni de descorazonar a Roland Barthes confundiendo la realidad con su representación. Eramos, sin duda, demasiado sabios para no inscribir el lugar del espectador en la concatenación significante o para no vislumbrarlas ideologías que persistían detrás de la falsa neutralidad de la técnica. Incluso Pascal Bonnitzer y yo fuimos muy valientes en aquel auditorio universitario repleto de izquierdistas burlones, cuando gritamos con voz temblorosa que una película no se "veía" sino que se "leía". Esfuerzos loables por permanecer del lado de los que no se dejaban engañar. Esfuerzos loables y, en lo que a mí concierne, vanos. Siempre llega el momento en que, a pesar de todo, hay que pagarla deuda en la caja de la creencia cándida y atreverse a creer en lo que se ve .

Ciertamente, no estamos obligados a creer en lo que vemos -incluso es peligroso- pero tampoco estamos obligados a amar el cine. Tiene que haber riesgo y virtud -en una palabra, valor- en el hecho de mostrarle algo a alguien capaz de mirar lo que se le muestra. ¿De qué serviría enseñarle a alguien a "leer" lo visual y a "decodificar" los mensajes si no persiste, así sea mínima, la más arraigada de las convicciones: que ver es siempre superior a no ver? Y que lo que no se vio "a tiempo" no se verá jamás. El cine es el arte del presente. Y si la nostalgia no le sienta para nada, es porque la melancolía es su reverso inmediato.

Recuerdo la vehemencia con que defendí este tema por primera y última vez. Fue en Teherán, en una escuela de cine.Frente a los periodistas invitados, Khemaïs K. y yo, había filas de muchachos con barbas incipientes de un lado y filas de bultos negros del otro (sin duda eran las mujeres). Los muchachos a la izquierda y las chicas a la derecha, según el apartheid en vigor allá. Las preguntas más interesantes (las de las mujeres) nos llegaban en forma de papelitos furtivos. Al verlas tan atentas y tan estúpidamente cubiertas, me dejé llevar por una cólera sin objeto que no iba dirigida a ellas sino a toda la gente del poder para quien lo visible era ante todo lo que debía ser leído, es decir, sospechado de traición y controlado con la ayuda de un chador o de una policía de los signos. Envalentonado por lo extraño del momento y del lugar, lancé una prédica en favor de lo visual frente un público cubierto que asentía con leves movimientos de cabeza.

Rabia tardía, rabia terminal. Porque la época de la sospecha se acabó definitivamente. Solo se sospecha allí donde una cierta idea de la verdad está en juego. Los únicos que reaccionan son los integristas y los beatos, los que le buscan pulgas al Cristo de Scorsese y a la María de Godard. Las imágenes ya no están del lado de la verdad dialéctica del "ver" y del "mostrar"; pasaron íntegramente a formar parte de la promoción, de la publicidad, es decir, del poder. Es demasiado tarde para no empezar a trabajar en lo que queda: la leyenda póstuma y dorada de lo que fue el cine. De lo que fue y hubiera podido ser. "Nuestro trabajo será mostrar cómo los individuos reunidos a oscuras encendían la imaginación para calentar su realidad (el cine mudo). Y mostrar cómo dejaron extinguir la llama al ritmo de las conquistas sociales, contentándose con mantenerlo a fuego lento (el cine sonoro y la televisión en un rincón de la pieza)". Cuando estableció este programa (fue ayer, en 1989), el historiador Jean-Luc Godard podría haber agregado: "¡Al fin solo!".

En cuanto a mí, recuerdo muy bien el momento preciso en que tuve que revisar el axioma del "travelling de Kapo", y también el concepto casero de "cine moderno". En 1979 se exhibió en televisión la serie americana Holocausto, de Marvin Chomsky. En ese momento concluyó una etapa que me envió de regreso a todos mis puntos de partida. Porque si bien los americanos le permitieron a George Stevens realizar en 1945 el sorprendente documental del que hablamos antes, nolo difundieron nunca a causa de la guerra fría. Incapaces de "tratar" esa historia que después de todo no era la de ellos, los empresarios de espectáculos americanos la habían dejado provisoriamente en manos de los artistas europeos. Pero ellos (los americanos) tenían sobre esa historia, como sobre cualquier historia, un derecho preeminente, y tarde o temprano la máquina televisiva hollywoodense se atrevería a contar nuestra historia. Lo haría con todo el respeto del mundo pero no podría hacer otra cosa que venderla como una historia americana más. Holocausto sería entonces la desgracia que le ocurre a una familia judía, desgracia que la separa y la aniquila: con extras demasiado gordos, grandes actuaciones, un humanismo irreprochable, escenas de acción y melodrama. Y el público sentiría compasión.

¿Es únicamente bajo la forma del "docudrama" a la americana como esta historia podría salir de los cineclubes y, por medio de la televisión, interesar a esa versión sumisa de la "humanidad entera" que es el público de la televisión mundial? Seguramente, la simulación-Holocausto ya no apuntaba sobre la alienación de una humanidad capaz de un crimen contra sí misma, sino que permanecía obstinadamente incapaz de hacer resurgir de esa historia a los seres singulares que fueron, uno a uno, con un nombre, un rostro y una historia, los judíos exterminados. Es una historieta (el Maus de Spiegelman) la que se atrevería, años más tarde, a perpetrar ese acto salvador de resingularización. La historieta, no el cine, a tal punto es cierto que el cine americano detesta la singularidad. Con Holocausto Marvin Chomsky volvía a traer, modesto y triunfal, a nuestro enemigo estético de siempre: el buen "poster" sociológico, con su casting bien estudiado de espécimenes sufrientes y su espectáculo de "luces y sonido" de "retratos-hablados" animados. ¿La prueba? En esa misma época empezaron a circular - y a indignar- los escritos revisionistas que niegan la existencia de los campos de exterminio nazis.

Necesité veinte años para pasar de mi "travelling de Kapo" a este Holocausto irreprochable. Me tomé mi tiempo. La"cuestión" de los campos de concentración, la cuestión misma de mi pre historia, siempre me sería planteada, pero ya no através del cine. Ahora bien, gracias al cine entendí por qué esa historia me afectaba, por qué lado me agarraba y bajo qué forma se me apareció (un leve travelling que estaba de más). Hay que ser leal hacia el rostro de lo que un día nos transformó. Y toda "forma" es un rostro que nos mira. Por eso nunca creí (aunque les temía) en los que desde el cineclubdel liceo huían con voz llena de condescendencia de los pobres locos -y locas- "formalistas", culpables de preferir al "contenido" de las películas el goce personal de su "forma". Solo quien se estrelló muy temprano contra la violencia formal terminará sabiendo de qué manera esa violencia tiene también un "fondo" (pero se necesita toda una vida, la de uno).Y llegará el momento, siempre demasiado pronto, de morir curado, habiendo trastrocado el enigma de las figuras singulares de su historia por las banalidades del "cine-reflejo-de-la-sociedad" y otras preguntas graves y necesariamente sin respuesta. La forma es deseo, el fondo no es más que la tela cuando ya no estamos ahí.

Todo esto me lo decía hace algún tiempo mientras veía por televisión un clip que entrelazaba, melosamente, las imágenes de cantantes muy famosos con las de niños africanos famélicos. Los cantantes ricos -"We are the children,we are the world!"- mezclaban su imagen con la de los niños hambrientos. De hecho, tomaban su lugar, los reemplazaban, los borraban. Fundiendo y encadenando estrellas de la música pop y esqueletos en un parpadeo figurativo donde dos imágenes trataban de ser una sola, el clip ejecutaba con elegancia esa comunión electrónica entre el Norte y el Sur. Aquí está, me dije, el rostro actual de la abyección y la forma mejorada de mi travelling de Kapo. Me gustaría que estas cosas asquearan al menos a un adolescente de hoy, o que le dieran vergüenza. No tanto vergüenza de estar bien alimentado y de ser opulento, sino más bien de que se considere que tiene que ser seducido estéticamente allí donde solo importa la conciencia (aunque sea mala) de ser un ser humano, y nada más.

Sin embargo, terminé por decirme, toda mi historia está ahí. En 1961 un movimiento de cámara estetizaba un cadáver y treinta años más tarde, un fundido encadenado hacía bailar juntos a los muertos de hambre y a los satisfechos. Nada cambió. Ni siquiera yo, siempre incapaz de ver en él lo carnavalesco de una danza de muerte a la vez medieval y ultramoderna. Tampoco cambiaron los conceptos dominantes de la postal bien pensante de la "belleza"consensual. La forma, sin embargo, cambió un poco. En Kapo todavía era posible detestar a Pontecorvo por haber anulado a la ligera una distancia que habría tenido que "respetar". El travelling era inmoral porque nos ponía, a él cineasta y a mí espectador, fuera de lugar. Un lugar en el cual yo no podía ni quería estar. Porque me "deportaba" de mi situación real de espectador como testigo para meterme a la fuerza dentro del cuadro. Ahora bien, ¿qué otro sentido podría tener la frase de Godard, si no el de que no hay que ponerse nunca en donde no se está, ni hablar en el lugar delos demás?

Cuando imagino los gestos de Pontecorvo al decidir el travelling, simulándolo con las manos, le guardo aun más rencor por cuanto en 1961 un travelling representaba todavía rieles, maquinistas, en resumen, un esfuerzo físico considerable. Pero me resulta más difícil imaginar los gestos del responsable del fundido encadenado electrónico de We Are the Children. Lo adivino apretando botones en una consola, tocando las imágenes con la punta de los dedos, definitivamente ausente de lo que (y de los que) ellas representan; incapaz de sospechar que se le puede tener rencorpor ser un esclavo de gestos automáticos. Es que pertenece a un mundo -la televisión- en el que, al haber desaparecido poco a poco la alteridad, ya no hay buenos ni malos procedimientos de manipulación de las imágenes. Estas ya no serán nunca "imagen del otro" sino imágenes entre otras en el mercado de las imágenes de marca. Y ese mundo, contra el que ya no me rebelo, que provoca en mí aburrimiento e inquietud, es precisamente el mundo "sin el cine". Es decir, sin el sentimiento de pertenencia a la humanidad a través de un país suplementario llamado cine. Y sé muy bien por qué adopté el cine: para que a cambio me adoptara. Para que me enseñara a tocar incansablemente con lamirada a qué distancia de mí empezaba el otro.

Esta historia, naturalmente, empieza y termina con los campos de concentración porque son el caso límite que me esperaba al comienzo de mi vida y a la salida de la infancia. En cuanto a mi infancia, hubiera necesitado toda una vida para reconquistarla. Es por eso -mensaje para Jean-Louis S.- que terminaré yendo a ver Bambi.


Publicado en Trafic Nº 4, otoño de 1992, Ediciones POL, París. Derechos reservados.Traducción del francés: Mauricio Martínez-Cavard. © 1995