«Se eu quero saber de alguma coisa eu não vou procurar na revista Time, ou vou ler a Newsweek ou qualquer outra revista do tipo. Elas têm muito a perder para publicarem a verdade. - Você sabe disso. -Que tipo de verdades estão a deixar de fora?»
Bob Dylan, no “Don''t Look Back” que D.A. Pennebaker fez em 1967.
Gosto de variadíssimas coisas no filme de Pennebacker e gosto de poder lembrar-me delas. Gosto que não haja “espectáculo” nem “magia” e gosto do anti-vedetismo de Dylan. Do seu laconismo que só por má vontade se pode confundir com pose. Que por uma vez não haja sombra de sexo, das drogas, das mulheres fatais ou das bebedeiras e que o filme nos deixe ficar com um artista, que antes disso é um homem, e com tudo o que existe à sua volta. Gosto mesmo muito de achar que não se trata de um "filme de música" (no sentido de filme-concerto e tudo o resto) mas sobre “o que” e “quem” está por detrás dela. Que exista assim um olhar flutuante e conciso que vai dos corredores aos camarins, da falsidade de certos elogios até ao êxtase do fãs, dos percursos de carro até aos momentos de deleite; mas um olhar pragmático e devorador (sem olhar para trás, precisamente) que faz com que apesar de tanto movimento e supostos pontos de vista, pareça ser um plano sequência de hora e meia, onde o conceito de “dispositivo” ou “programa” é coisa para caixote de lixo. Gosto mesmo dessa granulação que a película ostenta e desse lado manual e amador que hoje em dia só existe como estilismo e impressionismo. Gosto e acho enigmático o modo como também é sobretudo um registo da música que geralmente não sai cá para fora – a criação, os ensaios, os experimentos, as dúvidas, os falhanços – e como depois tudo isso vai ser percepcionado a uma nova luz aquando já no palco. Gosto da ausência de contra-campos. E a sequência que me rasga: o repórter africano a perguntar a Dylan se aceita responder a certas questões, e, quando a curiosidade das respostas aceites está no auge e o gravador ligado…pin, um fabuloso corte para Dylan e a sua guitarra no meio dos negros, num qualquer descampado. É preciso muito para chegar a isto. Cortar. Montar.
E só para me contradizer um bocadinho, só um bocadinho, curto muito, mesmo muito, a rapariga que está sentada e a fumar um cigarro na cena em que Dylan discute com o jornalista da Times. De quem se trata nem sei, mas acho que qualquer tipo de justificação é absolutamente desnecessária, basta ver…
E sei que foi a frase em epígrafe que me fez procurar o filme; sei que ela me diz o mesmo que Serge Daney me disse sobre os filmes que nos vêem crescer, que nos ensinam a andar e a estar, que nos olham, que sabem muito mais sobre nós do que nós sobre eles. “Se queres saber o que é o cinema e uma verdade, ou a música, ou a pintura…então, meu amigo, sabes o que tens a fazer e onde ir procurar.” E estamos conversados…
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