"O homem criativo não é um homem comum ao qual se acrescentou algo. Criativo é o homem comum do qual nada se tirou" (Abraham Maslow).
grande, grande Felipe M. Um abraço.
sexta-feira, 27 de novembro de 2015
quinta-feira, 26 de novembro de 2015
Nem o mais medalhado script doctor, o mais pró-activo dos estagiários da coluna de humor do último grito em suplementos culturais ou a vedeta da agência de escrita criativa que faz o horário nobre conseguiria conceber algo tão ridículo e inverosímil como o genial Philip Yordan conseguiu em papel para "The Chase" (* mais de dez anos antes de "Thunder Road", Robert Mitchum, indómitos, liberdade, Coreia), em 1946, a partir de Cornell Woolrich, o tal de Janelas Indiscretas. Um veterano de guerra que depois saberemos atormentado, sem cheta para um hambúrguer, encontra uma carteira cheia de dinheiro, gasta só o pequeno-almoço, devolve-a aos donos que são saídos de um conto de Edgar Allen Poe, esse mundo e essa luz começa-se a parecer também com Poe, e ainda por cima ganha a razão e a mulher da sua vida, e ou é tudo isto ou mesmo nada disto? Como se não bastasse semelhante tratamento ou descaramento, no centro do filme temos um flashback que pode ser o mais rápido e nefasto dos flash-forwards como premonição divina ou infernal, em sintonia com o deus na terra que é a anátema do veterano - flash que é o mais verosímil e, tem mesmo de ser, realista. Neste chafurdanço todo, a confiança que Yoarden teria de ter nas atmosferas escorregadias do destino e dos estúdios e na fibra dos rostos como na movimentação dos corpos (com o caparro de Robert Cummings estava metade ganho), em Arthur D. Ripley e nos restantes artesões para apagarem e vergarem as luzes quase todas do planeta câmara e ficar só o susto e o choque da descoberta do segundo seguinte ainda a brilhar tremeluzente (a janela do barco como espelho quebra mais do que 7000 anos de má sorte), bem como nos bichos desta terra e desta selva que não vivem pela matemática nem pela lógicazinha mas antes nos raios imprevisíveis e imprevistos da emoção, foi total, e assim não temos nada de especial nem de inteligente, somente a continuação e a sequela do corte umbilical. Quer dizer, antes de estarmos moldados, formatados, crescidos. Entre a primeira palavra do bebé e o carimbo bélico. Possibilidades e aventuras infinitas do cinema. Aceitação olímpica da vida.
* O Robert Mitchum de "Thunder Road" é o Mitchum de sempre, impassível no centro do dilúvio. Guia a mil à hora pelas estradas ensarilhadas com o bucho do seu carro pejado de álcool. Fá-lo pois os seus antepassados vieram para aquelas terras sem nada e com quase nada conquistaram o essencial. É o tramado do whiskey que despoleta a tragédia como poderia ser qualquer outra coisa. E fá-lo porque obviamente também gosta. Do perigo, isto é, fixar-se nos limites; só assim se justificará ainda a ideia da empreitada ter sido dele, lançando-se depois à música e não tendo pruídos em cantarolar, nas calmas. A sua sombra, a sua massa omnívora e omnipresente tudo abarca, tudo abafa, cega. Morre tão de pé como as suas palavras e actos, e entrega o seu irmão limpo à menina dos sonhos. Os funerais que se espreitam ao longe, tão arrastados e penosos, tão dolentes, são o reverso e o lamento dessa medalha. Ficamos a saber, em menos de meia dúzia de apontamentos, que Mitchum veio da guerra, mas nota-se, em cada acção e reacção e nada, que por ter visto nesses cenários o que nenhum homem necessita ver, o desassombro e a convicção estão tão inerentes nele como o respirar. Portanto, nem a Mãe, nem a amada, o irmão ou o Pai poderão chegar-lhe ao coração ou ao exemplo da forma conhecida - eles estão com ele e estarão para lá da conformidade e da lei. Um homem que viu demais e não aguenta a promiscuidade terrena. A ligação final, a marcha funerária e as mãos para sempre, são uma e a mesma coisa, já medalha una, numa certeza que eleva o amor, realmente e sublime, à selvajaria. Bruto e sem tempo nem espaço. Crepuscular e novo. A morte e a nascença a flutuar no cosmos misturado - "Birth was the death of him", segundo Samuel Beckett. Só umas luzes cinzeladas no grande mistério. Como o vento no deserto para a flor solitária.
terça-feira, 24 de novembro de 2015
Mark Robson teve de largar as casas dos loucos e as ilhas dos mortos para se enterrar numa realidade bem mais medonha e delirante, o quotidiano normalizado, a realidade e o espectáculo do dia-a-dia, o que nos dão a provar e a comer no sofá da engorda. Philip Yordan escreveu e produziu uma história que se é tão autobiográfica como aparenta e se diz, nos continua a condenar a cada dia que passa. Quanto a Humphrey Bogart, aparentemente tão ignóbil e sujo como os restantes que rodeiam a sua esposa e o boxeur-criança, teve de esperar pelo fim da vida para a sua cara inchada e os seus olhos a desfazerem-se de tremuras e de medos poderem expressar genuinamente a fonte de todos os ódios pelo que viu e a possível salvação de todos nós arrancada a ferros. Os cigarros, o whiskey, as mil vidas, e a correspondente consumição pelos meandros andrajosos da fama e do poder que todos os três experimentaram para atingirem o desassombro de passar do negro do cinematógrafo à luz de um bom sentimento final. Então, todos os temas eternos são convocados: o pecado e a perdição, a maçã e o inferno, honra e orgulho, a mãe e o fim; e todo o momento em pressão e tensão: o desemprego, a imprensa, a publicidade, o cinema e o desporto correspondentes da guerra, políticos e atentados. E o que é mais impressionante é que não estamos perante o supra-sumo da encenação de Robson, da caneta de Yordan ou do mito de Bogart: as cenas de boxe não são credíveis, os diálogos são brutíssimos e estão longe das sinfonias de "Johnny Guitar", Bogart está quase a estourar ou a mirrar. E por causa disso, porque se prefere a veracidade e o sujo do que já não cola nem se pode polir perfeitamente, este amontoado de arestas acinzentadas e feias, um coro indomado e primitivo de tão inteligente, o glamour calcinado pelo humanismo estropiado, o falso e o mais do que real entram em choque frontal. No desenlace, uma nova página e uma nova história estão prontas a ser rabiscadas, com todas as fraquezas da carne e da alma asseguradas. "The Harder They Fall" é o espelho disponível e o nosso ponto de chegada constante; com apelo de remissão lá pelos fundos. Tão perto da vida e tão perto da morte. Fechando no intervalo do quadro composto com o homem e a mulher. O intervalo do amor. Então, cada qual que se atire. Ou a um abismo ou a outro. Mas a um abismo.
quinta-feira, 19 de novembro de 2015
Com “Wild Horses” Robert Duvall
tentou ainda um lamento por aquilo a que chamam velho estar
constantemente a ser engolido por aquilo a que chamam novo; belos e
selvagens cavalos em colinas resgatadas e resistentes ao betão e ao
combustível. Mas falhou, falhanço que tanto mais dói quando se
pensa no enorme cineasta que estava em “The Apostle”, união de
Mark Twain e da grande literatura sulista americana com os
crepúsculos dos últimos clássicos de Hollywood. Ou porque os
executivos (Zanucks do Martim Moniz) lhe sacaram as mãos da massa,
ou porque já não é possível contrapor ou conciliar tais coisas –
sentimentos, paisagens, arquitectura - num mundo já definitivamente
outro e irremediável, o certo é que tirando os olhos fundos e
aterrados de Duvall tudo o resto é supérfluo e surpreendentemente
mal fabricado (quando se montam silêncios como se montam explosões,
é o fim sem princípio dele).
O velho cowboy e a sua sesta
pela sombra na desmesurada extensão agreste, o sol queimante
fustigando as pedras chamuscantes e o chapéu que faz parte do corpo,
a valente cigarrada a rimar com a fogueira da ordem, o cavalo ao lado
sentindo tudo e também não descansando... mas, grande mas, o som
alheio a esse quadro perfeito já fazia adivinhar a desordem e a
tragédia. Aviões e cowboys não é o habitual e a essa estranheza
Kirk Douglas ainda não se habitou, nem se vai habituar. Seguidamente
são as cercas, arames farpados, propriedades privadas... depois os
fumos e os químicos, os monstros motorizados, toda uma sujidade a
conspurcar o que era o límpido género cinematográfico americano
por excelência. Só nos podemos recordar do raivoso “Man Without a
Star” que King Vidor fez apenas sete anos antes de David Miller
ousar “Lonely Are the Brave” e termos ainda mais pena desses
homens e dessa única mulher que sofrem por não se saberem integrar.
John Huston tinha acabado de falar e de mostrar disso no
dolorosissimos como o rosto esfrangalhado de Montgomery Clift “The
Misfits”, e Wim Wenders iria depois comentar o mesmo em alguns
filmes sensibilíssimos e noutros menos bons, só que a definição
que Douglas dá à sua estirpe e o final há muito prometido nas
paralelas do progresso cravam outra ferida que ainda hoje não sarou.
É logo depois de ele ter estado com a mulher do seu melhor amigo e
de percebermos um amor para a vida e para a morte entre eles, logo
depois da inexplicável e óbvia bulha no saloon, logo logo depois de
forçar a prisão para poder estar um pouco com o tal irmão e de
perceber que esse homem que odiava as mesmas coisas que ele, esse
homem amante da liberdade que ajudava refugiados e não punha limites
no que a sua vista alcançava, já prefere aguentar a lei e as suas
cordas fortes para poder voltar para a mulher e para o filho e para o
lar. Douglas, que jamais conseguiria mudar embora se calhar o
quisesse, foge mesmo e volta à mulher para contar do que pensava não
ser possível. E redime então infindáveis seres e infindáveis
destinos: a doença ou a cruz da solidão; não se escolhe nada disso
por moda ou posição, nasce-se assim, aleijado; a única pessoa com
quem esses aleijados podem viver é com elas mesmas; matando quem a
elas se ouse juntar. E foge, foge, livre como o vento e condenado
pela sua natureza. O seu Whisky, nome do seu cavalo inseparável, com
brigas e reatamentos incluídos, vai com ele fazer a subida aos céus
que costumam fazer tais teimosos, provando a sua razão e os seus
motivos, mostrando que se existe para além do carimbo burocrático.
Longa caçada e outro ser extravagante para as novas regras e tempos,
o xerife de Walter Matthau, tão calmo e pacificado e certo como o
fantasma que tem de meter na jaula, ficando feliz pelo inimigo ter
escapado para assim poder fazer brotar novos anacronismos, balões de
ar e carne e osso que possam falhar, gente contrária aos autómatos
que comanda. Opostos nas farda e no ofício, compreendem-se numa paz
dos anjos que guardam só para si – esta criação e esta
correspondência só o impagável Dalton Trumbo a poderia ter sonhado
e concretizado, aposto. Mas, desconfiávamos, aquele adamastor TIR
que ia aparecendo sem lógica pelos interstícios, teria de ter
alguma função. Quando o xerife só pensava num bife e na cama
encontra na autoestrada o cowboy por terra, por lama, vencedor e
acabado, grande e imóvel. Sozinho e bravo. A câmara sobe
classicamente e alguém vai gritando para se ser rápido, Rápido,
Rápido, Rápido, até à exaustão. Para descer novamente ao betão
e encontrar o chapéu de toda uma humanidade sem dono, vilipendiado,
esquecido e em grande-plano. E as infinitas conclusões para tirar
desses choques. Sem legenda necessária.
quarta-feira, 18 de novembro de 2015
Cy Endfield pelos caminhos e
velocidades de “Hell Drivers” já se apelidava C. Raker Endfield.
O que um Homem tem de aturar... E como estava ele e a sua garra em
1957? Cada vez mais amador, isto é, tradicionalmente selvagem,
usando o que aprendeu e o que sabe que resulta, mas sempre a deixar
que o vulcão do instinto se manifeste. Um navegante da vida,
desempregado, saído da prisão, rasgado de cicatrizes, não segurado
socialmente nem fiscalmente, aterra em terra de ninguém e vê-se
obrigado a seguir as regras do jogo. Começava a ensinar Sam
Peckinpah por essa indefinida era: a honestidade e os pactos podem
ser uma e a mesma coisa, levando-se o que importa levar para a
frente. À primeira vista o pica-boi consiste em conduzir camiões
cheios de areia ou pedra de um lado a outro, velozmente e em concurso
de vale tudo, então ele e nós ficamos sem perceber nada de nada. O
estóico grupo Hawksiano de outrora está estilhaçado e a atmosfera
reenvia para os anestesiados de Monte Hellman a fazerem coisas sem
saberem de lógica, de entusiasmo, de sentimentos e pulsões comuns.
Visto daqui, do século XXI, tudo se parece com as globalizadas
corporativas assépticas a sujarem-se na sombra, os capitalismos
encapuçados que empobrecem o próximo, tais liberalismos cobardes e
trucidantes que reinventaram ou inventaram o genocídio moderno;
fica-se à nora e isso nada tem que ver com o talento do argumentista
ou com o plot fora de gancho, e é muito mais lato do que o ajuste de
contas político mencionado nas duas linhas de qualquer calhamaço
histórico do cinema. Do lado de Stanley Baker vão estar os bons, os
que querem entender ou só entrever alguma coisa para lá do cheiro
fétido que os enleia; da parte de Patrick McGoohan, marioneta num
palco que o ultrapassa, aqueles que só almejam o vil metal e a vil
ambição, não se importando que, como agora, os mercados, as
agências, os ratings, o abstracto mal que passa por bem prepare o
Apocalipse e a próxima guerra. Entre as opostas facções conhecidas
vão estar as mulheres, leves e carregadas dos problemas essenciais,
mulheres que ainda continuarão a resgatar. Porque órgãos como o
coração ou o incompreensível que se percebe nos sentidos e nas
dores, a alma ou o que for por ela, existirão enquanto o último da
raça não apagar a luz e meter ponto final na terra e na existência;
então, do virtual começa-se a entrar lentamente e de rompante para
o visceral. Visceral – as porradas e o sangue derramado pela
dignidade, os derradeiros suspiros por amor, a vingança animalesca
com causa depois de tantas outras faces oferecidas em vão, o
irracional superior, o absoluto em causa. Endfield, isto ninguém lhe
roubou, continuou a sentir os choques que Eisenstein causou entre o
inconcebível e o patético; e lembrou-se daquilo que lhe tiraram,
dos choques sempre por inventar, sempre a urgirem. Os líricos ventos
finais, as explosões como uivo no deserto, o abraço reservado ao
par e a nós enquanto quisermos, são do gesto da reposição, da
violência da reposição. Disto ninguém nos pode tirar. Mãos à
obra.
* Que hoje o filme se encontre nos escaparates mais expostos
das Fnacs ou das Wortens, com promoção incluída e imagem bem
tratada, talvez junto a um Lang ou a um Fleischer e longe dos
Autores, armado e disponível, é mais uma prova dos certos e dos
errados e da arte do tempo.
terça-feira, 17 de novembro de 2015
Os gritos,
os uivos, o gelo dos pesadelos e a melodia fantasista e assombrada do
Over the Rainbow criada para Feiticeiros de Oz entrelaçam-se em “I
Wake Up Screaming” para uma ultra realidade assomar monstruosamente entre o caos urbano e as mentes ludibriadas pelos sentimentos e pelo
caos outro e ainda mais mortífero das paixões. Em 1941 “Citizen
Kane” partiu do mítico para ir escavando até à infância e aos
pretéritos empoeirados pelas películas do tempo, mito novamente;
nesse mesmo ano, Bruce Humberstone, um Orson Welles a olhar das
valetas e dos tascos e becos das luzes indefinidas das sete e pico da
manhã, instala-se nas delirantes espirais da sede de fama e do
clamor das luzes da ribalta para descarnar e estripar as lendas e
mitos da sedução Hollywoodiana. Toda a parafernália e paracinema
em revelação ontológica. Não há culpados por aragem assim
viscosa e por chão assim deslizante, caldo espesso de brilhos
lânguidos onde a mulher sonhada no berço e redimensionada adultamente escancara a perdição mais antiga, imemorial, inata.
Mulher que se desmultiplica, magnetiza, fende, solda, tudo a uma
imagem autofágica; em visões impossivelmente ideais que ao perderem
a nitidez e o humano encorpam o altar dos mortos; mulheres que
regressam dos túmulos em salas de projecção e logo perto, em
espelhamentos, nos quartos de dormir ou nas paredes do cérebro. É
assim o paradoxo que atravessa todo o Cinema Americano que importa, a
sua esfinge e a sua bruteza: Victor Mature é apanhado numa massa
ferruginosa, em ângulos desequilibrados, coberto de luz escanifrada
e dura, exausta e enforcada, condenado; e todo esse pesadelo
inenarrável, sonho Kafkiano, teia Freudiana, Vertigo (semente,
bastardo, remake de outra vida do filme de Hitchcock) que cobre igualmente todos os
outros bebés grandes e medrados, é enformado e imediatamente
superado por um Agora absoluto de ruídos, texturas, morfologia,
enfim, corpo que é o do nosso mundo quotidiano e sensível, antes de
Deus e da prece; para se chegar ao fundo das coisas, passa-se pelo
delírio delas; aceitação e libertação. Over the Rainbow, Street
Scene orquestrada por Alfred Newman em cima de noites de mil olhos e
mil perfurações. No desenlace, nenhuma conclusão, ponto de
chegada, apenas mais um enlace de corpos que nessa bruteza à
Botticelli promete todos os imprevistos. Entre “Citizen Kane” e
“I Wake Up Screaming” tanto caem os patamares e os juízos de
valores como os filtros e os pilares da patenteada realidade. Para
uma dança e um vínculo e uma solidão perpétuos. O que os novos
mestres do motion grafics, dos after effects, das composições
photoshop e afins, especialistas e opinion makers para Curriculum
Vitae, o que tais não lhes cabe na cabeça é que aponta-se a
chamada câmara ou a língua, foca-se, pensa-se, e a complexidade
bruta da paixão ou do ódio, o nosso ajuste e a nossa construção
singular, comporta os filtros mais avançados alguma vez criados em
laboratório. Sem acordo. Sem compromisso. Inatos.
domingo, 15 de novembro de 2015
Agora que o ouro se foi, podemos voltar a ser amigos. Leigh Brackett (numa concentração e compressão à "Rio Bravo") elucidou em percurso linear toda a tortuosa história das relações e dos desejos. Gordon Douglas seguiu o rastro e a marcha e só lhe aparecendo poeira, mortandade, fossilização, forçou a câmara de tal maneira ao necessário enquadramento e foco que dominando a orquestração cinematográfica tudo lhe parece ter fugido nessa sinfonia da danação rasteira, completamente junto ao chão que tanto relevo apresenta. Partículas e véus em confrontação, minérios e respirações. "Gold Of The Seven Saints" desponta de escarpas e texturas corrompidas pelo valor do tesouro em questão, onde os maquinismos e a técnica da encenação se vão perdendo trementes, tenta a redenção carnívora, uma estabilização e compromisso ancestral, mas a pequena ilha de serenidade e luminosidade volta e torna a emperrar; do possível conforto, do possível e impossível lar, os dois ou três ainda crentes são largados ao espectáculo das ambições e dos acordos outra vez e sempre rasteiros, únicas leis perenes da largada paradisíaca, e o vento conflui com as aves nefastas, as pedras cobrem os corpos sacaneados e o sol devora-os sem apelo nem bênção, o amor vale tanto como essa outra grande pedra que destrói quem olhou o brilho do ouro tão de perto e foi castigado pela ousadia. Pó, vento, dureza, suores, incompreensível, o trajecto inteiro. E dois homens, no principio como no fim, ainda a cantarem, ainda falarem, ainda juntos. Num eterno retorno dúbio que tudo escurece. Compreende-se muito pouco e percebe-se muita coisa. "Gold Of The Seven Saints" é negro e elucidativo; e prepara e destroca o dilúvio de "Rio Conchos", a fossa e o vórtice e uma paz em "The Detective".
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