Pensava só em Eugène Green, em Alain Guiraudie. Afinal também há Serge Bozon. Tirando os que já há muito sabíamos, existe um trio lá pela França (como em todo o lado, fora os outros). E de que maneira. “La France", nos seus crepúsculos e nas suas alvoradas (ou auroras, atenção ao plano pedido a Murnau), é um filme dito de guerra (mas só dito) que tem saudades dos westerns em que os durões de repente desatavam a cantarolar, os Barry Sullivan, os Dean Martin, o Johnny Guitar. Saudades dos tempos em que certas mulheres disputavam em virilidade com os homens, como no velho género, as Joan Crawford, as Barbara Stanwyck e umas quantas mais…Disto, de infinitamente mais, e de quando “a câmara não era um olho, mas um olhar.” Ainda se ouvem os tambores ao longe, de quando em vez…
12 comentários:
Por acaso estou convicta de que, em dias de hoje, se podem contar na ficção, várias personagens femininas que disputam a virilidade com os homens. Uma representação que tem uma sequencialidade conveniente ao ponto em que nos encontramos.
Podem não ter a força de Joan Crawford em Johnny Guitar, mas isso já é da natureza dos próprios tempos, e da distância qualitativa a que infelizmente se está da narratividade de Ford.
Com certeza há bastantes outros... Mas lembro-me agora de
A dúvida (John Patrick Shanley, 2008),
O silêncio de Lorna (irmãos Dardenne, 2008),
Rosetta (irmãos Dardenne, 1999),
Juno (Reitman, 2007),
Fay Grim (Hal Hartley, 2006),
Revolutionary Road (Sam Mendes, 2008),
The Reader (Stephen Daldry, 2008),
Inglorious Basterds (Tarantino, 2009),
Jackie Brown (Tarantino 1997),
Kill Bill (Tarantino),
Death Proof (Tarantino 2007),
Nothing but the Truth (Rod Lurie 2008),
Thirteen (Catherine Hardwicke 2003),
King of California (Mike Cahill, 2007),
Changeling (Clint Eastwood 2008)
....
como alguns exemplos.
E se contares o crescente desses filmes de acção, de Catwoman, a Tomb Raider, a Æon Flux . . .
E mais as personagens da ficção das séries, como a matriarca de "Six Feet Under", a mãe de "Weeds", as mulheres solteiras de "O sexo e a cidade", as lésbicas de "Letra L, a família feminina de "Gilmore Girls", a chefe Tina Fey de "30 Rock", a "Buffy" que salva sempre o dia, e por aí fora.
Há uma nova virilidade na representação da mulher, que não abdica necessariamente de toda a sua feminilidade, mas que lhe confere já um certificado de igualdade em competências, e alguma autonomia em relação aos homens. E ainda bem.
(...sei que me vou lembrar de tantos outros ao longo do dia...)
Mais
as mulheres em Almodovar, em Cronenberg, em Sam Mendes, nalguns casos em Sofia Coppola... Um pouco antes, vários trabalhos de Agnès Varda... Bergman, eternas forças femininas... Em Alain Resnais, em Chabrol... O feminismo de Chantal Akerman...
... e mais uns títulos...
The Dreamers (Bertulucci 2003),
Annie Hall (Woody Allen, 1977)
Three Women (Altman 1977)
Manhattan (Woody Allen 1979)
Irina Palm (Garbarski 2007)
Basic Instinct ( Paul Verhoeven 1992)
Thelma & Louise (Ridley Scott 1991)
Wanda (Barbara Loden, 1970)
etc
. . .
...mas a Sylvie Testud é de carne e osso, não está possuida por nada (acho eu...), não têm super poderes, está sozinha no meio dos homens e mesmo assim vai "mais à guerra" que os outros....além disso o Allen, o Scott, e uma data desses não contam...eheh
...mais a sério, existem milhares, claro, mas como as dos westerns que cá sabemos....nem vê-las....
Por acaso não vi este filme da Sylvie Testud que deu o mote ao post, mas tu seguiste-o de uma afirmação categórica "saudades dos tempos em que certas mulheres disputavam em virilidade os homens", com que eu facilmente discordo e rapidamente exemplificaria cada um dos títulos enumerados, de acordo com a específicidade.
- Porque é que Woody Allen não conta?
O Woody Allen é um ressabiado que propaga de filme para filme a sua própria ansiedade, impotência e imprevisibilidade em relação às mulheres.
- Thelma and Louise não conta?
Cumplicidade forasteira homoerótica, fuga aos homens da vida de cada uma, assassínio do violador....
Bom, é certo que na maioria dos casos não há uma feminilidade acentuadamente demarcada, visível e comentada como a Vienna de Johnny Guitar, mas sob análise cada um dos exemplos é válido como detentor de uma força feminina particular.
Pois...
é o tempo do peixe miúdo.
não se distinguem propriamente tendências organizadas, há pouca coisa que valha realmente a pena, mas dentro das que valem há peças que valem pela eternidade.
Mas o revivalismo e as ânsias retrógradas são doença de todas as eras.
Via eu há uns dias o "Ervas Flutuantes" do Ozu (versão de 59), e também a personagem do pai-actor se lamenta pelos velhos dias do teatro, de um outro gosto do público, e a certa altura vê-se acusado pelo filho de ser antiquado, apontando-lhe o overdrama e o desajuste da sua personagem àquela actualidade.
Bom, eu acho que o elogio se deve fazer se o caso o merece mas, como dizia Georges Pompidou, uma pessoa deve ser do seu tempo.
como dizia o Carax: sou só deste tempo, mas gosta mais das coisas de outros tempos.
p.s: a Barbara Stanwyck do "The Furies" não dava chance a nenhuma dessas. eheheh
Tu sabes que eu gosto é do Godard.
Inovou, fez a dele como nenhum outro em seu redor, e continuou aí através das eras, a reinventar-se, a inovar-se e a fazer uso das tecnologias na medida do avanço destas, sem ficar preso ao que ele próprio inventou.
(falando nisso, tu colocaste aqui no blog um link para o blog "Signo do Dragão", num post intitulado Ca-ra-lho, que continha o trailer de Socialisme, e umas quantas frases escassas. Nessa ausência de conteúdo explícito, fiquei sem saber se há elogio ou desdém, tanto no teu gesto de "linkar", como também no próprio post do Bruno Andrade.
Expliquem-me sff.)
muito elogio, ou só elogio. o que o Bruno fazia era o enalteçimento dos "carrancudos, os sepulcrais e todos os filmes (Não Toque no Machado, Coisas Secretas, Antes Que me Esqueça, Juventude em Marcha e The Brown Bunny) que se deixam ver como do fundo de um abismo."
Filmes que precisamente não vão nas modas e nas falsas alegrias e festas destes tempos. Que mergulham nos abismos e no negro. Negro que como todos ficamos a saber, recentemente, é uma cor.
porque é que achas que o V. Gallo passa todos os minutos, nos seus filmes, com aquelas trombas?
de onde achas que vêm a tristeza do Godard, no "Notre Musique", por exemplo?
o mesmo para o Monteiro, O Nolot, o Ventura...
Os Miseráveis!
Bom, o cinema é e deve ser o espaço de todas as emoções, certo, em todo o espectro, mas sem exagero, sem deprimência mesmo que os tempos pareçam convocá-la.
Também gosto de ver as histórias felizes e acho que a comicidade entretém mas, no fundo, acho que pela via austera é que a mensagem chega ao destino.
Em Gallo, Godard, Costa, Monteiro.... a melancolia ou mesmo a antipatia são, julgo, no fundo sinais da mesma descrença. Em relação à era, à vida como ela se conhece hoje.
Por isso é claro que acho que a via da justiça é que se continuem a formar os rostos e as vozes atormentadas.
Mas há que haver contrapontos, não vamos fazer disso o Cinema. Porque há muitos anos que se recorda que o Cinema não é só arte, é também indústria.
Tantas vezes nesta dualidade, o agitar da mente por um lado e por outro o esvaziar dela pelo entretenimento.
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