terça-feira, 13 de setembro de 2011


Em "Ruby Gentry" Jennifer Jones tem tudo a seus pés e tudo lhe vai ser negado. Pelas gentes que não lhe perdoam as origens e as géneses, tais virtudes ou tais defeitos. E por algo tão elevado, poderoso e incomensurável que a parece abafar e não lhe querer entregar a única coisa ou o único homem que interessa.


Jennifer irrompe pelas águas, nas águas acaba. Costas voltadas.

Depois... os céus carregadíssimos e estridentes e sombrios que a escurecem e enegrecem o olhar e o íntimo. Céus feitos abóbadas incandescentes.

As florestas em que a candura mágica e doce da infância já lá vão e lhes devolvem (a ela e a ele) os genes de terror e de susto inatos dos seus desenhos e sarrabiscos. Florestas interditas – como "Beyond the Forest ", filme que conserva movimento idêntico e luminosidade/seu negativo que me parecem semelhantes como dois irmãos podem ser.

As árvores grandes, pequenas, rectas, torcidas, deformadas, envergonhadas ou imponentes que a espetam na penumbra.

Pântanos e lamacentas extensões de terra inundada, símbolos da derrocada.

Pedras de toque e outras estendidas que são como que altares de sedução.

As casas ou a casa mãe acima de tudo que são fogueiros que derretem o sangue, sugam horizontes, abafam pulsões, estralhaçam a carne e o nervo e a mente.

As portas que raiam halos de luz cegante e os rostos velados.

Ervas que se adivinham venenosas.

O acinzentado por vezes preto ar circundante feito de volúpia, êxtase e fim.

Os luares dos desejos e logo das perdições.

A grande metrópole como um braseiro insuportável que ainda mais arde e abafa do que a minúscula e concentracionária terra original.

De rompante e sem aviso...a noite perfeita que terá valido a eternidade e que ao mesmo tempo libertou e condenou: ela e o amado; ela a gata selvagem que o quer devorar e que por ele devoraria o mundo inteiro, ele que pelo estúpido do orgulho não dá o passo seguinte e só os dá ao para trás. Naquela idílica e libidinosa praia em que as águas e as ondas representam a massa e o jorrar da fome de ambos, esses movimentos que vão e vêm. A aurora ou o crepúsculo, a consciência da brevidade. A velocidade e a trepidação do automóvel, o turbilhão e prazer interior e exterior – escape das farsas e finalmente catarses prometidas e merecidas. As escalas e proximidades da câmara como medidor das temperaturas, única testemunha.

As águas fulminantes e desejantes, tal lirismo como os líquidos que brotam imparáveis e em torrentes contra os homens potentes/impotentes de "Our Daily Bread".

Porque serão as águas a tudo engolir. A cena Mizoguchiana da morte do amado e a cena escrita nos ventos (sem pais nem filhos) que também tanto lhe sopraram da morte do marido de conveniência. O seu apagamento, a magreza, entrega ao flutuar final e eterno.

Final em correspondência e antítese, sussurro e desprezo com o anterior "Hallelujah". Outro modo de regresso a casa e estagnação. Sangue em água diluído, o que dá?

Águas, terras, ares, os céus e as suas nuvens, pedras e tudo o que mais existe de vegetal, mineral ou animal...porque o homem no meio disto, face ao fatal destino ou ao seu acaso ou a qualquer negação. O panteísmo e o seu peso, suas forças e atracções.


Movimentos caleidoscópicos que King Vidor ergue com a rectidão, a incorruptibilidade, a garra e o total da sua mise-en-scène e que assim tudo deixa para incendiar e abanar e entrar em confronto e em violência nos corpos e nas vozes e nas almas e na vida que rasga pelos planos, este mundo.

Costuma-se dizer toda a América – metáforas, espelhos, mosaicos - como se diz com John Ford ou Howard Hawks ("American Tryptych", Tag Gallagher). É toda a humanidade, história das pessoas. Cravação mística.

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