1. “Cavalo Dinheiro” é um trabalho realista. Toda a fantasmagoria, assombração, obscuridade ou os trabalhos delicados da memória são filmados de forma directa, frontal, sem qualquer tipo de filtro ou exotismo que não aquele que o corpo, o lugar, a causa e logo a narrativa inerente permite emanar. Muitos filmes recentes, das mais diversas proveniências, têm usado o neo-realismo, o preto e branco ou toda uma movimentação de câmara aleatória para caucionarem a sua ligação à realidade das coisas, caindo assim nas aparências, no decorativismo e na falsidade; a CD, da circulação subterrânea da morte e do caos através da legislação e da burocracia terrena, ao romantismo pleno e terminal de dois rostos contra a criação, até à saída persistente para a luz com todas as promessas de dignidade, bastou colher e ligar toda uma experiência vivida e acreditar na força das palavras e dos olhares que vêm de dentro, da verdade primitiva que não se define.
2. Todos estão vivos, e se realmente há um morto-vivo, poderá ser o soldado no elevador, espectro que Ventura aceita, desfaz e adormece de acordo com as suas capacidades, da fúria à paixão; figura recordatória velha como a existência e a memória, é assim forjada pela simples e revolucionária capacidade do cinema em convocar e aglutinar o corrente com o extraordinário no mesmo plano. Ventura a arrastar o telefone na fábrica abandonada ou os seus telefonemas possuem a mesma pulsão visceral do elevador ou das visões surrealistas porque deslocadas (os abismos desta terra) da sua perdição pelas florestas.
3. Das fotografias de Jacob Riis ao Alto Cutelo dos Tubarões,
dos retractos comuns às melodias e aos ritmos da progressão e do relicário,
nada de teórico ou ensaístico para aluno se aplicar, propaganda ou reclame para
vender, tudo de presença e amor, essência de qualquer compromisso que importa. Junto
a Griffith e a António Reis, como de Robert Frank a Charles Burnett, de Rubens
ao último poeta sangrado que há-de resistir na derradeira sargeta (poesia, a
outra grande indefinição), incontáveis empenhados, incontáveis anónimos e o
fundamental: tudo importa, cada coisa ou cada ser ou cada obra de arte, assim
se revele o tesouro de cada qual, único e insubstituível. (*)
*Para efeitos comprovativos, Pedro Costa acaba de incluir na
programação de Janeiro de 2015 da Cinemateca - Portuguesa o último filme de Matt
Reeves: “Dawn of the Planet of the Apes”, 2014, USA
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