sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
selo de qualidade
“The Reader” não têm nada que mexa naquelas arrastadas duas horas, tudo é de cera, inerte, pomposo. Para mim é mesmo mal filmado e iluminado, à beira do mau gosto estético. A forma como os tempos são misturados e a narrativa assim fragmentada, numa tentativa de imprimir densidade e “significação”, é porventura o ponto mais baixo de uma dramaturgia que nada tem para oferecer, nada tem para pôr em jogo, para fazer sentir. Aliás, montagem é coisa que não existe, Daldry não possui qualquer senso de duração, de tensão – veja-se as cenas eróticas ou de tribunal, tudo possui o mesmo ritmo normalizado, marcado a cronómetro, maquinal. É o mesmo princípio da MTV, só que ao invés de se dirigir à juventude dirige-se à burguesia, aos votantes. MTV ao ralenti, não existem duas imagens ligadas que produzam algo, qualquer raccord. A mesma coisa para o sentimento de mundo, de ambiente, que obviamente se reduz a ilustrações mil vezes usadas para mostrar Berlim e os motivos em causa.
Essa coisa do peso da culpa e do arrependimento, da redenção, da má consciência, etc., tem as costas muito largas e serve para os poderosos ala irmãos Weinstein terem a sua aura de prestígio. Desconfiei imediatamente do produto assim que o vi ser promovido no programa da Oprah, na verdade, este é um filme-oprah.
Kate Winslet? Está bem e nada atrapalha, mas não creio que chegue.
(não precisava ter escrito isto, não precisava ter visto o filme, mas…)
Jerry Lewis in conversation with Peter Bogdanovich
Peter Bogdanovich: How did you start directing, Jerry? Didn't you do some home movies first? I take it you did Sunset Boulevard and you called it Fairfax Ave?
Jerry Lewis: Yeah. [laughter]. We did half a dozen satirical, ah...Fairfax Ave was Sunset Boulevard. OK. Then we did The Reinforcer.
(...)
(para me lembrar que tenho de caçar todos os que ele realizou...)
C'est à ce bel éclat de lucidité, cette manière d'aimer sans y croire - tout entière contenue dans la résignation du vieux Rourke soufflé comme un popcorn et rejeté par sa fille - que The Wrestler doit sa beauté aplanie : fiction-éclipse (sublime extinction du plan final) pour un mélodrame à l'admirable simplicité.
assim, sem muito barulho, só para mais tarde eu me lembrar. pois como diz o L.M.O: Há coisas que doem.
terça-feira, 24 de fevereiro de 2009
“Mister Lonely”
Auto-indulgência, já sabemos, é uma das palavras favoritas de Harmony, o tal Rimbaud de uma certa geração, e se tal vocábulo tem algo a ver com a libertação de todas as amarras a que o cinema em geral – e principalmente o cinema do país dele – se deixou prender, rumo a territórios próximos do sonho e da vigília, então, que seja sempre auto-indulgente – ele e o Gallo, p.e – que cá estou eu para curtir estas coisas.
E se “Mister Lonely” surge investido dos mesmos gestos, eles aqui não parecem tão perigosos e terminais, melhor, Harmony não usa de um tom quase ostensivo ou provocatório que irrompia nas fitas anteriores e que eram maravilhosos. É isso, existe aqui uma espécie de doçura, uma maior ternura para com os personagens – mesmo que os “Freaks” de Tod Browning continuem a ressoar – e mesmo para com os lugares, que parece algo de novo e sugere novos caminhos e reinvenções. Uma nova luz também e certas aberturas (discursivas, visuais) luminosas que parecem declaração de princípios do cineasta – mais indulgência… – mas que nunca se tornam moles nem requentadas, antes potência da estranheza. Coisas incríveis na imagem e no som, quase violentação entre as duas bandas, sobreposições encantatórias, uma vibração sonora por vezes áspera, crua, que junto com o brilho de certas imagens nos fazem sentir coisas realmente novas. Sentir é a palavra certa, é um universo antes de tudo sensorial, e tudo isto vale por si. Mesmo se podemos considerar este filme, e abra-se aspas, o seu mais “narrativo”.
Acho que vale a pena experimentar esta poesia nos antípodas de quase tudo o que se pode arranjar. Bónus: Leos Carax num papel, obviamente, esquisitíssimo, que só reforça o tom de estranheza geral.
Ainda a reforçar o fora-de-tempo da personagem de Randy (logo de Mickey), a cena em que ele escolhe aquela peça de roupa bastante berrante para oferecer à filha. “Não sei, esta parece mais Rock’n Roll. O que achas?”
Rock’n Roll, diz Randy. Pouco depois, Ratt a abrir a abrir com "Round and Round". Mais à frente Guns com "Sweet Child O' Mine", and so on...
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009
ainda sobre “The Wrestler”
Um inocente e meio anacrónico Randy pede-lhe para repetir o título do jogo umas 3 ou 4 vezes, depois pede-lhe para explicar sobre de que trata tal coisa. Obviamente que não fica muito convencido, se calhar nem entendeu bem aquela lengalenga. O miúdo, esse, está claramente a fazer um frete, um favor, nem sequer aceita um segundo round de desforra. Aquele já não é o seu jogo.
Parecendo que não, aquilo diz muito sobre o tipo de homem que ali está, e tem toda a razão o Randy, também eu joguei muitas vezes o “Call of duty” (prai o 2), altos gráficos, som potente, aventuras do arco da velha, etc…Mas nunca mais reencontrei a magia das primeiras vezes, uma Mega Drive e um Sonic em 2 dimensões, por exemplo...nada de muito sofisticado, mas na altura, tremendamente viciante e irrepetível.
É isso, as coisas andam explosivas demais, repare-se como Aronofsky filma humildemente tanto as caras dos personagens como o televisor com o jogo, uma certa ordem nas coisas.
Acho que no limite o filme é todo como no plano inicial – uma câmara a seguir um homem, o seu corpo, o peso deste e das coisas. E é assim que o filme se torna grande e vem mostrar coisas realmente vitais.
E Mickey Rourke é extraordinário, com todas as letras, o que ele oferece é a mais sublime dádiva que um actor pode dar ao seu realizador. Dá-se a ele próprio. E de resto é preciso dizer isto – Darren Aronofsky está totalmente à altura daquele homem e dos acontecimentos. É tanto mais surpreendente quanto é verdade. Zero de exibicionismos, zero de conceptualismos de pacotilha, nenhum “inventanço” de montagem, nem uma merda de um truque, tudo é filmado à altura dos homens e das ocorrências. Uma câmara que só se interessa pelo homem e pelo mundo que o rodeia, que cria o espaço necessário para captar perfeitamente os dois, para os fazer sentir. A câmara, o olhar, só têm interesse por aquela carne, por aquelas emoções sussurradas. Nunca ultrapassa a linha em que a técnica se faz matéria e centro. Ali a matéria é o homem e o mundo. O contrario dos filmes anteriores de Darren. Portanto, dizer que os actores estão fabulosos (e estão, todos), mas que Darren não cumpre, é uma daquelas boutades dignas do mais sofrível pedantismo. Porque a única coisa que aqui se manipula é a luz - tornada agreste, crua - o recurso mais antigo e essencial do cinema, que é o que tudo molda e deixa entrever. De resto, Marisa Tomei a estilhaçar qualquer ideia feita – presença de “tomates” (salvo seja) – rude, visceral, mas muito mulher. E também a Evan Rachel Wood, sempre que entra a coisa atinge umas alturas (foda-se, está linda)…
P.S: porra, os “coçórios” das cenas de luta reinventam a palavra visceral. E mesmo aqui só temos a câmara e a exposição da película a trabalhar. O resto é carne, sangue, suor. O Darren têm tudo nas mãos para se tornar outra coisa...
P.S 2: tanta coisa, blablabla, e eu quero é rever o filme…para apurar similitudes com o “Rocky Balboa”, estar com os três actores e para escrever umas coisas sobre os 90´s (ou então, não…).
domingo, 22 de fevereiro de 2009
sábado, 21 de fevereiro de 2009
Jim Jarmusch
......
Estava a ver um filme de Suzuki, não o referido mas sim “Tôkyô nagaremono”, do ano anterior, e não pude deixar de me lembrar constantemente do “Ghost Dog” do Jarmusch. Do filme e também das palavras acima transcritas, sabia que o americano tinha ido lá beber. Não curto a palavra pós-modernismo, já fiz questão de o dizer, portanto acho que o que Jim fez nesse fabuloso filme é aquilo que estamos (?, enfim...) sempre a fazer, aquilo que certos grandes cineastas não tem medo em assumir - um ter consciência de uma história e de um legado, o tal dado adquirido que anseia sempre por um novo ponto de vista. Isso e um insuflar com vida, com ar do tempo, com o outro. É por isso que posso ver 1000 vezes estes filmes de Jim, é por isso que não me faz nada mal a sensação de que eles parecem tão leves que logo se desfazem no ar. Têm lá todo um legado reconhecível, mas também tem todas a hipóteses de auto reconhecimento e de conhecimento alheio. Tão focalizado mas tão mais universal do que qualquer coisa de um desses filmes-puzzle que não necessito de dizer o nome.
O filme de Suzuki? De um lirismo doentio, lânguido, arrastado. Enquadramentos que podem definir o formato largo, cores lindas e dramaturgicamente muito fortes, golpes de raiva na movimentação de câmara que quase faz lembrar o meu americano favorito, etc. Sim, tudo isto, um cineasta de génio, mas…e levo isto assim na inocência, quero rever e rever o Ghost Dog. Não tenho culpa. Não pára de crescer.
sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009
Mutatis mutandis, a mesma merda se eu fosse critico de cinema. Um qualquer Bruno Nogueira ladrava e a minha única preocupação – “o fair play é uma treta”, disto percebe o Jorge Jesus – era partir-lhe a cara ou, simplesmente, mandá-lo foder....
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009
"Obama"
Questão inevitável: como é que Shanley vê o seu filme na América presidida por Obama? A resposta envolve tanto de cepticismo como de esperança: "A América inchou como uma rã.
Tem-se dito que é o primeiro fantasma de Barack Obama a aparecer no cinema americano. Numa entrevista à revista "Attitude", Gus Van Sant concedia que sim.
E eles insistem…
Sinceramente, já cheira muito mal. Já fede. Desde “The Dark Knight” (ai que o Obama é o cavaleiro negro…) que praticamente todos os filmes, de uma forma ou de outra, americanos ou não, têm misteriosamente alguma relação com a eleição de Obama e com a América de hoje. Por favor ?!?!...já mete nojo este autismo, este querer ser importante e actual, esta banalização de ideias.
Que se segue? Descobrir o "lado Obama" no novo filme de Oliveira, no novo Kiarostami, no novo Valente?
Shut The Fuck Up
Em frente, “Valkyrie” é um grata surpresa, um relato praticamente gélido, directo e sem qualquer tipo de ganga – visual, narrativa – de um daqueles acontecimentos que à primeira vista nem dá muito para acreditar. Sem nenhum tipo de sentimentalismo, sem nenhuma pompa, right to the point. Notável a maneira como Singer manda às urtigas qualquer espécie de simplismo/maniqueísmo, para seguir numa direcção e num olhar que tem muito a ver com o de Clint Eastwood no “Letters from Iwo Jima” (guardadas todas as distâncias). Dir-se-ia que é um filme feito por um alemão, preocupado em mostrar que nem todos os membros do poder, naquele tempo específico que o filme trata, estavam ao lado de Hitler e concordavam com as suas ideias. Mas não, é feito por tipos de Hollywood, e, assim mesmo, é complexo e preocupado em mostrar homens e motivações, antes de mitos e de ideias feitas. Dá para calar muita gente. E se este confronto de forças brutas, de homens máquinas, é captado com uma distância implacável e com uma secura incorruptível, outro dos trunfos é o modo como o cineasta domina todas as potências do falso, no sentido mais imediatamente visível, desde a ausência de sotaques manhosos, passando pelo corpo mutilado da personagem de Cruise, até toda uma envolvência atmosférica e a composições de quadro que incrivelmente remetem mais para o passado do cineasta do que para qualquer convenção de “filme de guerra”. Isto, elididos todos os excessos. O resto é feito como nos tempos clássicos, das maquetas – aquilo é o poiso do Hitler e é mesmo, eu não faço mais perguntas. Acho que é esta dialéctica e esta ambiguidade que mais me interessa no todo. De resto é um divertimento inolvidável, carregado de planos surpreendentes e montado de maneira quase cientifica no que diz respeito à exploração e criação do suspense e da tensão.
Ahh, e para os espertinhos, Tom Cruise parte a louça toda – prodígio de contenção e de sangue frio – e mostra que gente como Kubrick, De Palma, Scorsese, etc. não se enganaram.
*Dito isto, é o máximo que se pode fazer (ou quase, vá lá…) quando não se é Lang ou Carpenter, e é muito.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
sempre apreciei os escritos do Cyril Neyrat.