sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

"Austrália" - Baz Luhrmann

Ridícula a ideia de que Baz Lurhman recuperou qualquer noção de cinema clássico para esta sua tentativa de revivalismo épico. Zero de classicismo – a não ser que se entenda tal pelo respeito dos raccords no eixo, argumento formatado, e pouco mais…– como nada de neoclassicismo. Pensem em Cimino e estamos conversados. Se se quiser uma palavra definidora dos moldes em que o filme trabalha só se poderá evocar aquele conceito, um pouco horrendo, um pouco sem sentido – pós-modernismo (arghh, como custou…). Coisa que de resto se associou a Luhrman.
Começa logo pelas personagens, autênticos bonecos, máquinas de debitar diálogo, descontextualizadas e sem nada que nos faça acreditar, que nos suspenda a descrença. Isso é mais do que evidente, o resto é ainda mais evidente – ambiências e cenários de plástico, bonitinhos – o virtual a deitar por terra qualquer possibilidade de inserção numa tradição – planos supersónicos a varrerem e a acelerarem a acção e a pretenderem deixar o cunho épico (aqueles afastamentos ao para cima, pretensão de planos totais, por favor…), uma arritmia absurda a concorrer para o aleatório total, para a completa dispersão, para um desajuste e para uma confusão que não serve de maneira nenhuma qualquer propósito, como por exemplo servia em “Moulin Rouge” (são outros vinte e não me alongo...), mas que só põe em evidência a falta de ponto de vista e de controlo dos meios, e da narrativa, que o cineasta de certeza experimentou. Sim, o orçamento monstruoso e a pretensão assumida deu cabe de qualquer possibilidade. Aceleração da acção, dizia eu, e o mais incrível é que o filme parece ter o triplo do tempo, sem rumo e sem qualquer mestria narrativa, coisa que era uma das pedras de toque de gente como O. Selznick/Fleming, Huston, etc…
É que nem se pode falar em academismo, como em “Atonement” ou em “The English Patient”, ao contrário do que a publicidade escreveu, “Austrália” não trabalha sobre modelo nenhum, sobre memória alguma, não existe nada que possa ser vislumbrado/sentido em espectro, nada que se queira cristalizado, é o caos e, repito, a inexistência de qualquer projecto. Não há uma ideia, como disse uma vez Pedro Costa, a propósito de “ A Selva”, não existe uma folha ou um corpo que mexa.

“Austrália” fica como um espectáculo do virtual, quem quiser que fique com isso, delírio de colagens (corta e cola, sem mais) ridículas de muitos planos, demasiados. Demasiados e sem qualquer lógica, à força de ter que se encontrar um formato e uma duração comercial. Como em "Indy 4", os computadores e a simplicidade/mau gosto dos filtros a impor-se a todo o momento aos rolos de película da Kodak, e, o mais importante, a qualquer concepção cinematográfica, artesanal, tradicional, etc…

Se Luhrman, e quem mais o quiser, estiver a pensar em cinema clássico, mais vale que pense em noções como lisibilidade, concisão, timing, só para ficar por aqui. Isto ao invés de queimar dinheiro e dinheiro. Neste sentido, um dos filmes mais erráticos e lamentáveis dos últimos tempos.

2 comentários:

Daniel Pereira disse...

Revendo um dos mais clássicos filmes dos últimos tempos, o "Rocky Balboa" claro, reparei, pela primeira vez, enquanto limpava as lágrimas que sempre me caem ao ver o filme, um extraordinário salto no eixo por alturas do combate.

José Oliveira disse...

sabe-a toda o homem. também revi no outro dia, continua a crescer. um momento, Stallone na mesa para os tipos que o querem no combate: "I think I want to, like, fight , you know. Nothing big, just small things, like, local..."

tocante