quinta-feira, 3 de julho de 2008
Walsh
Raoul Walsh dos anos 50, Raoul Walsh prodigioso, melhor, essencial, o que vai dar à mesma coisa.
É o Primitivo e este titulo acenta perfeitamente. Começou no mudo e definiu muito do sonoro, singularmente e com uma pureza que muitos tentaram e só ele desta maneira consegui.
Não há palavras para filmes como os dos anos 30 em que a obra-prima The Roaring Twenties arrebatou tudo e fechou gloriosamente a década – ainda hoje Scorsese lhe deve muito.
Os anos 40 e o seu trabalho na Warner foram, talvez, o período mais grandioso, obras de uma genuinidade e de uma candura impares, cinzelamentos com a câmara numa superfície –este mundo – que é o mundo onde acontece o cinema.
Pursued, Colorado Territory ou Objective, Burma!, cada um cada género, são diamantes esculpidos, serenamente demenciais e trágicos.
Mas antes dos 60, os 50. E um filme que não é deste mundo, embora, como em todos os Walsh, só haja este mundo e nenhuma fantasia fora dele.
Tem o título de The Revolt of Mamie Stover e é de 1956, é filmado em cinemascope, belas cores, praticamente technicolor.
Mas, introduzindo estes instrumentos, a pureza, a economia e o sentido do humano continuam tão ferozes como em qualquer uma das obras máximas.
É pois a história de Mamie Stover (a mítica e incomensurável Jane Russel), mulher mais do que misteriosa, que, por obrigação (a policia não a quer por lá…) deixa S. Francisco rumo ao Hawaii. No barco conhece um escritor, Jim Blair (Richard Egan) que primeiro, quando Mamie lhe pede para escrever a sua história, lhe diz que há infinitas histórias iguais às dela e que não vale a pena redigir de novo, para logo depois, já apaixonado ou simplesmente fascinado, lhe afirmar que ela é realmente invulgar.
Termina a viagem, ele empresta-lhe dinheiro mas tem uma mulher à espera, ela vai trabalhar para um clube, separam-se.
O dinheiro vai ser o pretexto para se encontrarem, e o pretexto para se desiludirem e separarem. Arrebenta a guerra, o escritor torna-se activamente parte dela (chega a capitão), ela diz que deixará o clube e que terá os seus negócios, ambos juram que um dia serão felizes no alto da colina.
Ele cumpre a parte dele, mas Mamie, dominada pelo vício ontológico do dinheiro não larga a vida e quebra a regra do jogo tornando-se famosa.
O final, quando Jim volta para a insultar mas não consegue está ao lado de coisas como Pursued.
E o que espanta é a forma - as formas - como Walsh trata este conto, com as cores e com o desmesurado 2.35 : 1 na sua forma mais singela e mais serviciente perante os sentimentos, o Homem e o meio. Em S.Francisco como na ilha paradisíaca, no night club como nas cenas de guerra.
Não precisa de afirmamentos nem de mostrar o que possui – erro em que tantas vezes a Hollywood clássica caiu e hoje cai praticamente todos os dias – e mesmo que quisesse não poderia. Walsh liga a câmara e é como se estivesse a descobri tudo pela primeira vez. Um pouco como Rosselini é uma falta de originalidade que por sua vez produz os milagres mais indizíveis. Monumental obra a de Walsh, monumental filme este.
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