quinta-feira, 28 de agosto de 2008

«Se a palavra tem um sentido e sejam quais forem as divergências que possam surgir na sua interpelação, a partir de um certo acordo parece-me que o neo-realismo se opõe em primeiro lugar essencialmente não apenas aos sistemas dramáticos tradicionais, mas ainda aos diversos aspectos conhecidos do realismo – tanto em literatura como no cinema – pela afirmação de uma certa globalidade do real. Retirei esta afirmação que me parece justa e cómoda o abade A.Ayfre (Cfr. Cahiers du Cinéma, n.º17). O neo-realismo é uma descrição global da realidade por uma consciência global. Quero dizer com isto que o neo-realismo se opõe às estéticas realistas que o precederam e especialmente ao naturalismo e ao verismo, dado o seu realismo não incidir tanto na escolha de assuntos como na tomada de consciência. O que é realista em Libertação é a resistência italiana, mas o que é neo-realista é a realização de Rosselini, a sua apresentação ao mesmo tempo elíptica e sintética dos acontecimentos. Ainda noutros termos, o neo-realismo recusa-se por definição à análise (politica, moral, psicológica, lógica, social ou tudo o que quiser) das personagens e da sua acção. Considera a realidade como um bloco, não decerto incompreensível, mas indissociável. É em especial por isso que o neo-realismo é senão necessariamente antiespectacular (ainda que a espectacularidade lhe seja efectivamente estranha), pelo menos radicalmente antiteatral, na medida em que a actuação do actor teatral supõe uma análise psicológica dos sentimentos e um expressionismo físico, símbolo de toda uma série de categorias morais.»

A.Bazin

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