sábado, 14 de junho de 2008

Se o percurso dos filmes não fosse sujeito a mundanos e variados acidentes, o deste teria retomado o seu fôlego reparador no fim de A COMÉDIA DE DEUS e, encontrado que estava o ritmo e o ânimo para o resto da caminhada (as excepções são as cenas do psiquiatra e do hospício, filmadas em 1995), tudo parecia indiciar uma rota segura e o povoamento da terra arável de um sonho tomado no seu absoluto amoroso, isto é, horrorosamente monogâmico.

Teríamos, por certo, um silogismo nupcial suficientemente solar para ser não só portador da sua própria incandescência, como para encandear a substância selénica do filme precedente (A COMÉDIA), esclarecendo-lhe, na sua função de agente revelador, a alquimia do seu sentido obscuro.Ora, dado que a história das coisas não só não foi essa, como não foi moldada em acordo e consonância com o nosso novo desejo, receio bem que, uma vez mais, nos encontremos confrontados com uma aporia tanto mais perversa quanto mais delicada.

Não lembra ao diabo fazer um filme que, ainda por cima com alguma ironia, nos fala repetidamente da impossibilidade do seu propósito, da impossibilidade da sua razão de ser.

Sossegai-vos, no entanto, ó incrédulos. Pode-se viver com isso, pode-se viver assim.

E alguns de nós, (poucos, espero), terão de convir que AS BODAS DE DEUS é um filme delicioso. Noblesse oblige.

João César Monteiro

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