sábado, 28 de junho de 2008

County


Mais uma revisão de The Bridges of Madison County. Para além de ter ficado com a mesmíssima sensação que fico sempre que irrompem os créditos, ou seja: o grande filme de Clint Eastwood e por arrasto dos anos noventa, ficou-me, como fica sempre, um diálogo.
Aquele em que Meryl Streep e Clint Eastwood sentados num jardim contemplam umas fotografias dele. Streep diz-lhe que haveriam de estar publicadas, que ele é um artista.
Eastwood responde-lhe que ninguém as quer e que já se habituou à ideia de que não faz parte dessa comunidade dos artistas, que simplesmente não o é e que se sente bem assim.
Mais coisa menos coisa é assim, ou é assim que me lembro dele.
Para além de ser a melhor definição de alguém que trabalha em arte, ser profissional e não artista, trabalhar e expor-se e abandonar a aura, é a definição perfeita da carreira de Clint, da sua divida dos grandes clássicos, Hawks e Ford de mãos dadas com Huston e Siegel.
Porque quem filma assim o homem, o ser, com esta atenção e simplicidade só pode ser Hawksiano, e como ele, hoje em dia só Eric Rohmer.
Mas já agora reparemos como quem referiu Resnais a propósito do último filme (Letters from Iwo Jima) já o poderia ter feito aqui. A atenção às coisas que não duram e que tem prazo, que estão prestes a degradar-se. O desprendimento nostálgico e a captação do ser nos espaços vazios – aquele plano, quando a família de streep volta a casa, em que no vazio, ao olhar da mulher sobre a estrada soam os acordes do romance, é a prova máxima e perfeita.
Um clássico e um moderno nesta captação do fora.
Só um Eastwood desta vida consegue um milagre destes.

4 comentários:

Júnior disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
José Oliveira disse...

é mesmo, e por isso tudo fico sempre a preferir a fatia de vida à fatia de bolo.

Carlos Pereira disse...

Concordo absolutamente. O meu Eastwood preferido e um dos melhores filmes dos anos 90 - interessante como ele fica bem ao lado do visceral Crash de Cronenberg nesse top!

Falam de Eastwood como o último dos clássicos, e é-o de facto. Não diria que temos aqui o crepúsculo de Letters From Iwo Jima ou de Million Dollar Baby. Este é uma aurora. Sinta-se isso no olhar de Meryl Streep, durante qualquer cena de proximidade entre ela e Eastwood. Mesmo quando tudo é platónico. O crepúsculo, no máximo, vem depois, na última oportunidade - à chuva, no carro. Mas não, não pode ser crepúsculo, não há ali violência imponente ou brutalidade de gestos. Tudo é lento, suave, imerso num trágico desencanto.

Obra-prima.

José Oliveira disse...

impressionante como no final Eastwood se dilui, quase se emula; como Unforgiven ou Million Dollar Baby. Apaga-se.