"À medida que evolui para essa cada vez mais ostentada transposição dum primeiro nível de realidade, Oliveira tende a serenar a câmara e a conotá-la com a cada vez mais explícita função de registo (...) a câmara não necessita de gritar a sua presença".
João Bénard da Costa, Manoel de Oliveira: a magia do cinema, in Revista del Occidente, 1994
Em Francisca, outro filme "camiliano", nunca sabemos porque é que José Augusto, depois de ter raptado Francisca e de se ter casado com ela, não consumou o casamento. Tudo quanto se sabe é que houve uma revelação terrível que o levou a suspeitar da virgindade da mulher e a recusar-lhe o corpo para sempre. José Augusto mandou autopsiar o corpo de Francisca, para saber se ela era virgem ou não. Mas os resultados dessa autópsia - se os houve - não os conhecemos. Essa virgem, que sabia que a alma é um vício e que o desejo é parente pobre da eternidade, que conheceu do vício ou do desejo para além da rua das mulheres vulgares? Nunca o saberemos e nenhuma autópsia o revelará. Por isso, José Augusto também morreu. "Morreriam por não serem uma só pessoa." Esse coração que, vivo, "é que era assustador. Saíam dele coisas espantosas: o destino de um homem e de mais até. A verdade absoluta e vingativa também lá se fabricava".
João Bénard da Costa, Pedra de Toque, in catálogo do Festival de Turim, 2000, pg. 161
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